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Na Globo, as três “monstruosidades” de Lula

Marco Zero Conteúdo / 26/08/2022

Crédito: Sérgio Figueiredo

por Flávio Carvalho*

“Juntar-se com adversários para lutar contra os antagonistas” (Paulo Freire).

Beba água (se possível, um golinho a cada pergunta), tente não perder (sem forçar) o sorriso e fique repetindo mentalmente: eu tenho que ser eu mesmo; eu tenho que ser eu mesmo…

Se você estiver sentado (exposto) na cadeira mais assistida do país de dimensões continentais, você está ali porque gosta – e somente pensa em aproveitar. Tudo fica melhor quando a gente se sente bem.

Tão importante quanto a fala do candidato, é a sensação que ele, o seu corpo, sua expressão, nos transmite. Quem segue o Lula há muitos anos, até gosta de perceber a evolução com que se apresenta.

Eu me lembro de estar num bar, em Olinda, no ano 1989. Eu era um jovem iniciando-me na política, por causa de uma paquera, uma menina linda. Assistíamos juntos, centenas de pessoas, ao debate eleitoral na TV, entre Lula e Collor. Este, nascido da aristocracia alagoana, sacou da manga da camisa um dizer-se mais pobre que Lula: tinha até, em casa, um equipamento de som mais modesto que o petista; mentia Collor de Melo, conseguindo impressionar milhares de brasileiros. Até da marca eu lembro: Gradiente.

O fato é que, ontem, assistindo a entrevista de Lula na Rede Globo, pensei naquele tempo em que ficávamos em casa repetindo: “diga isso, Lula; não deixe de falar aquilo; mencione aquele imprescindível tema”. Falar isso, no sofá de casa, é fácil. É igual a assistir jogo de futebol e – desprezando toda a carga emocional pesando sobre as pernas dos jogadores – ficar repetindo: “esse gol, até eu faria”.

Eu discordo muito do Lula. Me sinto capaz de elencar uma série de assuntos em que me imagino (soberbo!) debatendo privilégios com ele (que eu e ele temos). Ou sobre intolerância antifascista (antídoto contra intolerância fascista). Ou sobre a primeira vez na história em que metade da população (a feminina) se sentiu representada ao sentar-se na cadeira da Presidência da República e olhar na cara de 500 anos de Patriarcado… Vários temas. Mas, quem sou eu? E quem é esse cara, o Lula?

Naquela época, da paquerinha, eu entrei no partido que ele fundou. Perto do tempo em que foi preso, injustamente, pela ditadura militar. Logo, comecei – internamente, dentro de um PT cheio de tendências políticas diversas (não antagônicas; sim divergentes e complementares) – a fazer parte dos grupos internos mais críticos. Sempre “mais à esquerda” que ele. Meti o pau. Bati boca. Quase cheguei à ir pra porrada, como bom machistazinho testosteronado. Congresso da CUT, do PT, da UNE. Tempo bom.

Sabe no que deu tudo isso?

Todas as poucas vezes (somando todas, podem chegar a uma dezena; e isto muito me impressiona, ao forçar minha própria memória) que estive presencialmente com o Lula, declarei-me absolutamente incapaz de contra argumentar qualquer coisa que ele falasse. Alguém mais já passou por essa sensação?

Mesmo ao seguir pensando que eu estava plenamente correto, O Monstro era capaz de convencer-me de tudo absolutamente ao contrário. Desenvolveu extraordinária capacidade de não somente demonstrar-te – nos conteúdos em que fala com imensa propriedade-, mas de influenciar o sentimento do interlocutor. Como? Transmitindo os três valores que ontem, ele, Lula, mencionou. Três valores que ele apresentou, quando metade de um país gigante parou para assisti-lo na Globo. A rede de televisão que já tentou de tudo para maquiar e manipular a história contra o partido que Lula criou. A verdade vence.

Credibilidade, Previsibilidade e Estabilidade.

Credibilidade (Confiança no cara), Previsibilidade (Confiança no rumo) e Estabilidade (Confiança na História de Vida). Transmitir Respeito pelo interlocutor: e não interromper a mulher, jornalista. Dar-nos a sensação (Previsível): esse sujeito, eu já bem o conheço. E transformar Estabilidade em Paz. E Amor.

Ele, Lula, ganha em presença. Sentirá isso, ao ler esse texto, quem lembrar-se de haver estado, algum dia, diante dele, falando com ele, fazendo uma foto com ele, escutando-o o falar em qualquer ato político. E também, surpreendentemente, sentado no sofá de casa, assistindo à televisão e sentindo como se o cara estivesse sentado ao seu lado, no sofá, com a cerveja aberta, de bermuda e chinelo, assistindo um jogo de futebol. Jamais esqueço do vendedor de amendoim, na praia, que me disse, orgulhoso, olhando nos meus olhos: Lula me disse que eu posso. Antes de Obama, do Yes, I Can.

Sabe fazer isso como ninguém.

Pois, em números absolutos, nenhum líder mundial já esteve com tanta gente, presencialmente, em tantos anos de caminhada. Pense nisso, se ainda não parou pra pensar. Quantos ministros de educação em um único governo fascista? Em quantos partidos transitou o Tchutchuca? E o Lula? São quantos anos já, que desse pernambucano o Brasil – e o mundo – não param de falar? O cara estava condenado à morte, pela fome, na sua infância. Quem ousa falar de fome na cara de um cara desses?

E acabo com uma historinha.

Fiz a mesma pergunta, duas vezes, em Brasília e em Barcelona, ao fotógrafo oficial do Lula, Ricardo Stuckert: “é verdade que você pegou meu e-mail para enviar-me essa foto com o Lula, igual que fará com todas essas inúmeras outras pessoas? Dá pra confiar que essa foto irá nos chegar?”.

Sim. A foto chegou no meu e-mail e ainda hoje segue chegando em milhares de casas do gigante Brasil (com as novas tecnologias, esse recurso, do e-mail, pouco se usa). Observe como ele gosta de deixar-se fotografar. Já o vi atrasar um almoço em duas horas, pra repartir-se em selfies com o povo.

Explicou-me um ex-assessor de Lula, o falecido Marco Aurélio Garcia, numa visita ao Palácio do Planalto. “Você imagina o impacto que tem uma foto com o Lula – o primeiro Presidente latinoamericano que dormiu no quarto ao lado da Rainha da Inglaterra, no Palácio de Buckingham – pendurada essa foto da Dona Maria abraçada ao Lula, na parede da casa dela, no sertão de Pernambuco?”. Isso não é campanha eleitoral. Isso é um projeto político. Até mesmo uma fala programada, de tantas vezes repetida, começa a sair espontaneamente. Não é que seja bom ator. É que o personagem já o incorporou. Vem de dentro.

Daí que, não é que ele, Lula, voltou a ser candidato. A pergunta é: “e quando foi que ele deixou de ser?”.

Atenção. Seguirei discordando do Lula em várias coisas. E seguirei gostando que ele me convença a seguir, eu, depositando nele a minha confiança. Confiança pra votar é fácil. Eu confio é em pedir voto.

Agora mais que nunca. Porque não se trata de eleição a cada quatro anos. Porque, mesmo divergindo, estamos falando de um mesmo projeto político. E os nossos antagonistas, assumiram que são – cada vez mais – fascistas.

Se você não gosta do cara, prepare-se. E jamais se aproxime. Sua monstruosidade contagia. É a política!

(Aliás, Política é isso; o resto é resto). Aquele abraço.

*Escritor e sociólogo pernambucano, residente em Barcelona (Espanha)

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