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Foto: Caranguejo Uçá
Maiores prejudicados pelo derramamento de óleo no litoral brasileiro, os pescadores artesanais ainda esperam a reparação de parte dos danos sofridos. Em Pernambuco, uma decisão judicial em caráter liminar, em dezembro passado, determinou a ampliação do pagamento do auxílio emergencial, liberado pela Medida Provisória 908/2019. Isso porque apenas 4.236 profissionais tinham sido contemplados pela medida no estado, mas aproximadamente oito mil foram prejudicados. Agora a União foi intimada pela Justiça a comprovar que cumpriu essa liminar. O prazo se encerra no próximo dia 11.
Pela determinação judicial, a União deveria ter pago R$ 1.996, em duas parcelas iguais, aos pescadores e pescadoras artesanais dos municípios de Barreiros, Cabo de Santo Agostinho, Goiana, Ilha de Itamaracá, Ipojuca, Jaboatão dos Guararapes, Olinda, Paulista, Recife, São José da Coroa Grande, Sirinhaém, Tamandaré, Rio Formoso, Abreu e Lima, Igarassu e Itapissuma. De acordo com o Conselho Pastoral dos Pescadores Regional Nordeste (CPP-NE), até agora, apenas os 4.236, previstos na MP, receberam auxílios neste mesmo valor.
Francisco de Assis de Santana é pescador em Rio Formoso (litoral Sul de Pernambuco), um dos municípios que seriam beneficiados. Ele contou que, por lá, nenhum pescador recebeu o auxílio emergencial. “A gente continua sendo prejudicado. Antes do óleo atingir as praias, a gente saia pra pescar e vendia de 15 a 20 quilos de peixes. Agora ninguém quer comprar por medo de contaminação“. A baixa nas vendas desvalorizou o preço dos pescados. “O quilo da tainha, por exemplo, era vendido a R$ 16 ou R$ 17. Tem gente vendendo por R$ 10 – R$ 12 pra não perder a pesca”, explicou Francisco.
Em outubro do ano passado, o ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento confirmou que 7,7 mil pescadores artesanais tinham sido prejudicados pelas manchas de óleo em Pernambuco. Mas a MP 908/2019 foi publicada, em novembro, considerando apenas as praias diretamente atingidas pelo petróleo. Assim, o número de beneficiados foi reduzido para pouco mais de quatro mil pessoas.
“Quem pescava em estuários ao lado das praias diretamente atingidas, por exemplo, ficou de fora”, comentou Severino Santos, educador social do Conselho Pastoral dos Pescadores Regional Nordeste (CPP-NE). Ele diz que o cumprimento da liminar é importante para contemplar todos os quase oito mil prejudicados e para corrigir distorções, como o caso do município de Rio Formoso, onde Francisco pesca. Por lá, as praias da Pedra e do Porto foram contaminadas, mas como elas só entraram na lista de localidades atingidas do Ibama depois da publicação da MP, os pescadores não receberam os auxílios.
O cumprimento da liminar, em si, não resolve o problema por completo. Isso porque quem tem o cadastro nas colônias de pesca, mas não tem o RGP (Registro Geral da Atividade Pesqueira) ficará de fora do auxílio. O problema é que a emissão desse registro está parada no Brasil desde 2012. Atualmente existem 13,1 mil pescadores com RGP em Pernambuco. Mas, em 2010, um levantamento do Instituto Oceanário da Universidade Federal Rural de Pernambuco registrou 30 mil pescadores artesanais no litoral do estado.
Entre os não elegíveis ao benefício, garantido pela liminar, ainda estão os que tiveram o pedido do registro ou da regularização da licença indeferido, quem fez sua inscrição no RGP, protocolo de solicitação de registro inicial ou de entrega de REAP (Relatório de Exercício da Atividade Pesqueira) depois da publicação da Medida Provisória 908/2019, e, obviamente, os que já foram beneficiados pela MP.
O RGP também é exigido para a liberação dos valores determinados pela Medida Provisória. Isso está prejudicando o recebimento do benefícios em todo o país, de acordo com a Confederação Nacional de Pescadores e Aquicultores (CNPA). Como a expedição deste documento está defasada, mais de 50 mil pescadores possuem apenas o protocolo de solicitação do RGT. “Deixa muita gente de fora”, disse o presidente do CNPA, Walzenir Falcão, em audiência pública no Senado, na última terça-feira (18).
A juíza federal titular da 7ª Vara da Justiça Federal em Pernambuco, Ara Carita Muniz da Silva Mascarenha, foi quem determinou que a União deve comprovar que cumpriu a liminar e pagou os benefícios aos quase oito mil pescadores em Pernambuco. A decisão é resultado de uma ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal, com denúncias do CPP-NE, do Movimento dos Pescadores e Pescadoras Artesanais de Pernambuco e da Articulação Nacional das Pescadoras Artesanais em Pernambuco (ANP-PE).
A União também foi intimada a apresentar, em 30 dias (a contar de 11 de fevereiro) os dados dos pescadores que fizeram protocolo junto à Superintendência Federal de Agricultura, Pecuária e Abastecimento de Pernambuco e informações do INSS dos profissionais da pesca artesanal. Ainda cabe recurso no processo.
Jornalista formada pela Universidade Católica de Pernambuco (Unicap) e pós-graduada pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Foi repórter de Economia do jornal Folha de Pernambuco e assinou matérias no The Intercept Brasil, na Agência Pública, em publicações da Editora Abril e em outros veículos. Contribuiu com o projeto de Fact-Checking "Truco nos Estados" durante as eleições de 2018. É pesquisadora Nordeste do Atlas da Notícia, uma iniciativa de mapeamento do jornalismo no Brasil. Tem curso de Jornalismo de Dados pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e de Mídias Digitais, na Kings (UK).