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Crédito: ASA Brasil/Adriana Noya
Há mais de duas décadas as cisternas de placas fazem parte da paisagem do semiárido brasileiro e da vida de quase um milhão de famílias agricultoras nos nove estados do nordeste e norte de Minas Gerais. Os números dos programas de construção de cisternas estão sempre disponíveis e atualizados ao menos uma vez por mês no site da Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA). Faltava uma pesquisa científica que apontasse como e porque a vida de agricultoras e agricultores mudam quando passam a contar com essa tecnologia de captação de água das chuvas.
Agora, não falta mais. A ASA apresentou os resultados de uma pesquisa de análise qualitativa realizada em conjunto com o Instituto Nacional do Semiárido (Insa), unidade de pesquisa do Ministério da Ciência e Tecnologia. A pesquisa é resultado de um convênio assinado em 2012 e teve início em 2013, mas só foi finalizada este ano porque as famílias de dez territórios em oito estados nordestinos foram monitoradas ao longo de anos. Por enquanto, o relatório foi apresentado em live apenas para as entidades ligadas à Articulação.
“Um estudo sistemático abrangendo diferentes contextos socioambientais da região ainda não havia sido realizado. Para superar essa lacuna e sistematizar ensinamentos úteis ao aprimoramento das políticas de adaptação às mudanças climáticas e combate à desertificação, a execução da pesquisa avalia a contribuição dos programas da ASA para a construção da resiliência socioecológica na agricultura familiar na região”, informa o relatório do estudo.
A análise das mudanças na qualidade de vida das famílias considerou aspectos econômicos, considerando inclusive o total de rendimentos obtidos com a venda de produtos agrícolas, a autonomia do agrossistema das propriedades, integração social de integrantes das famílias, diversidade da produção e acesso a mercados e a políticas públicas, por exemplo. Em todos os casos estudados nos municípios de Curaçá (BA), Porto da Folha (SE), Maravilha (AL), Araripina (PE), Juazeirinho (PB), Campo Grande (RN), Tianguá (CE) e Massapé (PI) os parâmetros avaliados comprovaram a melhora da vida de quem recebeu cisternas.
De acordo com a avaliação dos pesquisadores do Insa, no entanto, essa melhoria não se deve apenas à incorporação dessa tecnologia nas propriedades das famílias agricultoras. O relatório explica que é importante “ressaltar a ação protagonista dos atores locais, sejam eles indivíduos ou coletivos, na determinação do desenvolvimento dos agroecossistemas.”
A pesquisa identificou que a evolução constatada “contraria frontalmente” a teoria da modernização agrícola como fator de desenvolvimento. Ou seja, as famílias do semiárido desmentiram o entendimento “dominante nos meios científico e político, agricultores e agricultoras são considerados receptores passivos de tecnologias e que devem se guiar pela racionalidade empresarial de gestão”.
E isso aconteceu exatamente porque as decisões estratégicas das famílias não seguiram a lógica de ter atender às demadas dos mercados de insumos, produtos e serviços para ter resultados financeiros imediatos. As famílias do semiárido se guiam por uma lógica econômica “ípicas da agricultura camponesa” para tomar decisões estratégicas, considerando também “a elevação do da segurança econômica diante da imprevisibilidade climática da região”.
O semiárido Semiárido brasileiro é uma das maiores regiões semiáridas do planeta. Com área de 982.000 Km2 e uma população de 22,5 milhões de pessoas, a região ocupa 18,2% do território nacional e tem 12% da população do país. Nada menos que 35% dos estabelecimentos da agricultura familiar brasileira (1,5 milhão de propriedades) estão no semiárido, que também abriga mais da metade da população brasileira classificada como “muito pobre”.
Jornalista e escritor. É o diretor de Conteúdo da MZ.