Apoie o jornalismo independente de Pernambuco

Ajude a MZ com um PIX de qualquer valor para a MZ: chave CNPJ 28.660.021/0001-52

Por que Túlio Gadelha quer impedir o próprio irmão de ser candidato a vereador do Recife?

Direção municipal do partido Rede, controlada pelo deputado, vetou o nome de Ricardo Gadelha

Inácio França / 12/07/2024
Montagem com duas fotos lado a lado. À esquerda, Ricardo Gadelha: homem branco, de cabelos escuros lisos, barba rala, sorrindo e fazendo um L com os dedos em direççao à câmera. Ele veste uma camiseta vermelha com a inscrição O voto é secreto em letras brancas; à direita, Túlio Gadelha: homem branco, de cabelos, barba e bigode escuros. Ele está falando ao microfone no plenário da Câmara Federal e veste paletó bege, gravata vermelha e camisa branca.

Os períodos de definição de candidaturas e formação das chapas que irão concorrer às eleições são sempre ricos em notícias de acordos desfeitos, traições, sabotagens e recuos inesperados. No entanto, a informação de um deputado federal manobrar para impedir que o irmão, filiado ao mesmo partido, seja candidato a vereador, soa estranho até mesmo para os padrões atuais da política. Mas é exatamente isso que está acontecendo na Rede Sustentabilidade, legenda criada pela ministra do Meio Ambiente.

O pivô dessa história é Túlio Gadelha, reeleito deputado federal por Pernambuco em 2022 com mais de 134 mil votos. Ele é o parlamentar que está fazendo de tudo para impedir que seu irmão mais velho, o médico Ricardo Gadelha, de 40 anos, três a mais do que o parlamentar, tenha direito a concorrer ao cargo de vereador do Recife pela federação PSOL-Rede.

Como o próprio Túlio Gadelha ignorou às nossas tentativas de contato por whatsapp, apesar das mensagens terem sido marcadas como lidas, tentamos entender a razão do veto conversando com seu irmão e com integrantes do grupo político do parlamentar na direção municipal do partido. Os dois lados dessa controvérsia dizem que o motivo seria a necessidade de Gadelha em manter uma suposta coerência de “lutar contras oligarquias políticas em Pernambuco”, que seria a base sobre o qual teria construído sua imagem pública.

Essa foi a justificativa dada por dois aliados de Túlio que concordaram em falar com a MZ sob a condição de manter o anonimato. Eles disseram desconhecer qualquer acordo firmado pelo deputado com os irmãos Wanderson e Ebinho Florêncio de impedir que os projetos as ambições de Ricardo atrapalhassem o projeto de reeleição do vereador Ebinho em 2024. “Acho que não houve negociação nesses termos não. O que Túlio receia é ser acusado de estar colocando a família na política depois de tanto criticar essa prática”, explica um dos seus aliados que, na reunião da direção municipal realizada na terça-feira, dia 9, foi um dos dirigentes que votou pela exclusão do nome de Ricardo Gadelha da chapa proporcional da federação PSOL-Rede.

Ricardo, o primogênito

Ricardo Gadelha também acredita que essa é a motivação do irmão. “Nunca houve nenhuma briga familiar, nenhuma intriga, nada disso. Acho que tem a ver com o ego e com autoritarismo, do tipo ‘eu quero que seja assim, então tem de ser assim’, mas se ele é contra as oligarquias, há alguma coerência em defender Raquel Lyra no governo estadual?”

Especializado em Medicina da Família e da Comunidade, ele afirma que começou a fazer política antes de Túlio: “fiz movimento estudantil nas faculdades de engenharia e de computação, que cursei antes de fazer medicina, fui presidente do diretório acadêmico da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), onde me formei. Me filiei ao PDT porque admirava Leonel Brizola, eu era brizolista”.

Para Ricardo, o mandato do seu irmão em Brasília defende causas justas, está alinhado com o campo progressista, “mas suas práticas não são democráticas. No movimento estudantil, a gente aprende a dialogar com os diferentes, a tentar encontrar pontos de convergência para poder construir algo maior. Túlio quer apenas impor sua vontade”.

Na reunião onde sei nome foi vetado, os 12 aliados do deputado que votaram pela sua exclusão alegaram que o motivo foi um só: “infidelidade partidária”. A justificativa seria o fato de Ricardo e Alice Gabino, pré-candidata a vice-prefeita, terem defendido o nome da deputada estadual Dani Portela (PSOL) para encabeçar a chapa majoritária para a prefeitura do Recife. “Como pode haver infidelidade se fazemos parte da mesma federação partidária? Por isso eu disse nas postagens que isso era uma aberração”.

Alice Gabino contou que, uma vez, ouviu de Túlio Gadelha a seguinte justificativa para ter barrado a candidatura de Ricardo a deputado estadual em 2022: “ele me disse que, na família, a única pessoa que podia entrar na política era ele mesmo”.

Naquele ano, Ricardo já havia pedido licença da secretaria estadual de Saúde, onde é médico concursado, para disputar a eleição. “Meu nome foi retirado da chapa no dia da inscrição, fiquei muito magoado, ma decidi não brigar para não prejudicar Túlio e não azedar o ambiente na família”. Foi Gabino quem o segurou na legenda, impedindo que ele trocasse de partido.

Desta vez, ao ver os integrantes do grupo do irmão, levantarem a mão para barrar suas pretensões, ele pensou “não acredito que ele fez isso comigo!”. Então, resolveu que não ficaria calado.

Alice Gabino acredita que a candidatura de Ricardo será confirmada, pois a decisão final caberá à direção nacional, onde o grupo de Túlio é minoritário.

AUTOR
Foto Inácio França
Inácio França

Jornalista e escritor. É o diretor de Conteúdo da MZ.