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Crédito: Twitter/João Gomes
Um dia depois do início da campanha eleitoral, o Marco Zero recebeu um dos maiores shows dos últimos tempos. Palco gigantesco, público assombroso. O ídolo do momento, o hiper carismático João Gomes, com um repertório estourado, cantando para a gravação de um DVD. Foi uma superprodução e o partido do prefeito do Recife, João Campos (PSB), não deixou de tentar tirar algum proveito. Mas a estratégia pode ter virado contra.
Ainda na terça-feira, começou a circular nas redes sociais uma imagem apócrifa mostrando Danilo Cabral (PSB) e Lula (PT) ladeando João Gomes, com a frase “Frente Popular do Piseiro”. Antes do show, João Campos e João Gomes se encontraram nos bastidores. No seu perfil oficial no Instagram, o prefeito postou dez stories sobre o show. Primeiro, mostrou a estrutura, fazendo questão de afirmar que a apresentação teve “zero custo para a prefeitura” e que vai ter “um retorno incrível, mostrar nossa cidade para o Brasil e para o mundo”.
Depois de mostrar o palco, Campos surgiu ao lado de João Gomes, tomando um cafezinho, sua marca registrada. O prefeito falou que o artista tinha escolhido o Recife e que ia ser histórico. Sorridente, João Gomes se limitou a dizer que estava sendo uma benção e que o Recife que o tinha escolhido, agradecendo. João Campos ainda postou uma selfie com o cantor e depois fez vídeo e foto com o sanfoneiro Jeovanny Gabriel, amigo de infância e integrante da banda de João Gomes. Para finalizar, postou duas lindas fotos aéreas do Recife Antigo tomado pela multidão. No feed, a publicação ao lado de João Gomes está com quase 40 mil curtidas, bem acima da média da conta do prefeito.
A militância do PSB também aproveitou e muito o show de João Gomes. E com todo conforto. Vários militantes postaram fotos e vídeos bem em frente ao palco, em uma espécie de área vip. Ex-secretária executiva de juventude da Prefeitura do Recife, Camila Barros fez stories para seus quase 10 mil seguidores com vários outros militantes socialistas no espaço. Ainda com o show rolando, aproveitou para divulgar a inauguração do comitê de Pedro Campos, candidato a deputado federal.
Um dia depois do show, a campanha de Danilo Cabral aproveitou para circular um vídeo em que João Gomes segura no palco uma camisa da farda escolar da rede estadual. “É a mais famosa do Brasil”, afirmou o cantor, com a farda na mão. A referência é para as dancinhas do TikTok em que alunos da rede aparecem com a farda. Militantes do PSB postaram um vídeo que usa esse trecho, puxando para o lado de Danilo Cabral. “As fardas da rede estadual de ensino de Pernambuco são um sucesso. Elas surgiram em 2008, como uma política pública de Danilo, que era secretário de educação no governo Eduardo Campos”, diz trecho do vídeo da campanha de Danilo.
Mas o “retorno incrível” esperado pelo prefeito talvez não venha. Ou só venha para João Gomes – que teve um show elogiadíssimo por quem foi. Pouco depois da festa acabar, o que se viu nas redes sociais foi uma enxurrada de vídeos que não vão reverter bem para as gestões do PSB na capital e no estado: muitos arrastões e muitas brigas. Nos comentários, a oposição acabou fazendo a festa, denunciando a falta de segurança.
O Governo do Estado colocou 410 policiais militares no show. A estimativa é de que 150 mil pessoas tenham ido até o Recife Antigo para ver João Gomes. Em nota, a Secretaria de Defesa Social afirmou que foram registrados 12 ocorrências, sendo apenas quatro flagrantes. Também foi divulgado que foram realizados apenas três atendimentos do Samu, todos por conta de agressões. Números que se afastam das imagens de confusões generalizadas nos vídeos das redes sociais. A volta pelo transporte público, um calo histórico do Recife, também ganhou destaque nas reclamações. Nas redes sociais, o prefeito já virou a página e hoje não deu um pio sobre o show, apostando no engajamento de ontem para divulgar a construção de um novo Compaz, no Ibura.
João Gomes é do sertão pernambucano, de Serrita, mas morou a maior parte da vida em Petrolina. É um artista do seu tempo: em 2019 começou a postar cantando no Instagram, assinou com um empresário do ramo e começou a fazer sucesso. Hoje, aos 20 anos, está no auge. Tem música na novela Pantanal (Eu tenho a senha, com melodia e letra muitos graus acima da média radiofônica) e lota festas pelo Nordeste afora. Ao falar do novo disco Digo ou não digo, o crítico de música GG Albuquerque afirmou que o artista faz a trilha de uma urbanização dos interiores do país. “O movimento de João Gomes é menos tornar-se pop, mas reler o vocabulário pelo seu local de origem. É um projeto de renovação que está sempre fincado nas histórias de quem veio antes”, escreveu.
Afora a relevância na música popular, e o poderio empresarial por trás, João Gomes construiu uma imagem extremamente carismática nas redes sociais. Frequentemente se mostra com saudades de ou acompanhado da mãe, da avó, dos amigos e parentes do sertão. Faz vídeos contemplando as paisagens da caatinga, tomando seu café da garrafa térmica. Ex-estudante do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano (IFSertãoPE), é religioso e gravou uma música gospel para a mãe. Sempre fala de Deus para seus 13,5 milhões de seguidores no instagram.
A postagem do feed de João Gomes sobre o show, publicada na madrugada de hoje, tem um erro que constrange a Prefeitura do Recife. A postagem afirma que “milhares de vidas em Recife se perderam esse ano devido a fortes chuvas. Aquele dia meu coração partiu por essa cidade….e hoje me encheu de alegria”. O que aconteceu foi uma tragédia, a maior dos últimos 100 anos no Grande Recife, mas não é verdade que “milhares de vidas” se perderam, já que oficialmente foram 132 mortes em Pernambuco nas chuvas do final de maio.
A posição política de João Gomes é pouca divulgada: não segue Bolsonaro, nem Lula. Também não repostou os stories com o prefeito João Campos, nem o segue. Entre os candidatos ao governo de Pernambuco, a conta dele no instagram segue apenas Miguel Coelho, prefeito de Petrolina, do partido de direita União Brasil. Fagner e Vanessa da Mata foram as participações especiais da gravação do DVD no Marco Zero. Fagner apoiou Bolsonaro em 2018, mas se arrependeu e já acionou a Justiça Eleitoral para que apoiadores do presidente parem de divulgar um vídeo que ele gravou na época. Já Vanessa da Mata, que passou anos sendo “isentona”, tem declarado em shows que vai votar em Lula. João Gomes, até agora, segue discreto.
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Jornalista pela UFPE. Fez carreira no Diario de Pernambuco, onde foi de estagiária a editora do site, com passagem pelo caderno de cultura. Contribuiu para veículos como Correio Braziliense, O Globo e Revista Continente. Contato: carolsantos@marcozero.org