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Sistema Nacional de Cultura e Lei Paulo Gustavo: qual o papel do Governo do Estado?

Marco Zero Conteúdo / 20/04/2023
Sala de cinema, com foto focando a tela colorida, com pessoas na plateia de costas e sentadas em poltronas forradas na cor vermelha e encostos de madeira.

Crédito: Elimar Caranguejo/Secult PE

por Carol Vergolino*

É fundamental reafirmar a força e a pujança da cultura no nosso país e no nosso estado. A cultura precisa ser reconhecida no seu caráter cidadão, simbólico e econômico. Passamos por tempos sombrios no nosso país onde a cultura foi criminalizada pela gestão fascista, que acabou com o Ministério e com diversas políticas públicas que estavam em andamento. Mas nós ganhamos a eleição e retomamos, com o governo do presidente Lula, o Ministério e um projeto político que trás em sua centralidade o investimento na Cultura. Somente esse ano serão mais de 10 bilhões de reais investidos no setor.

E sabemos que a cultura é capaz de recriar novas narrativas, fazer pensar, questionar. É o alimento para a alma. E também a comida no prato de muitos brasileiros. Um setor que, mesmo sofrido, emprega quase 5 milhões de trabalhadores, sendo na sua maioria mulheres. De acordo com o Observatório do Itaú Cultural a economia da cultura e das indústrias criativas no Brasil, ccorresponde a 3,11% das riquezas geradas no país no ano de 2020, superando a setor automobilístico, que respondeu a 2,1% do PIB.

Qual o papel do Estado então? Sabemos que para participar do Sistema Nacional de Cultura os estados e municípios precisam de da tríade, o chamado CPF da cultura: conselho, plano e fundo. Nosso estado tem muito trabalho a fazer porque dessas 3 premissas, ele conta apenas com o conselho. Um conselho que carece de escuta da gestão e que precisa ser fortalecido pra a plena participação da sociedade civil, que hoje não conta nem com diária de transporte e alimentação para participar. Conselheiros viajam do sertão para a capital com recursos próprios para participar das reuniões.

Pernambuco não tem plano. Há alguns anos foi realizada uma conferência estadual que preparou um Plano Estadual de Cultura que nunca foi votado nessa casa porque simplesmente não foi apresentado pelo executivo. Foi engavetado pelo governo do PSB. É preciso realizar a conferência esse ano e votar um plano e que seja aprovado. Vire lei. Principalmente com o ítem que vincula o orçamento da cultura à receita do estado. Porque sabemos, não se faz política pública sem recurso.

Nosso estado também não tem Fundo. Apesar da lei 16.113, no seu Art. 3 dizer que: “Fica instituído o Fundo Pernambucano de Incentivo à Cultura – FUNCULTURA, mecanismo de natureza financeira e contábil que a cada final de exercício financeiro, os recursos depositados no FUNCULTURA, não utilizados, serão transferidos para o exercício financeiro subseqüente, sendo mantidos na conta do Fundo para utilização e informar seus rendimentos”. Acontece que essa conta não existe. O Funcultura não tem CNPJ e não tem conta específica. Portanto, não é fundo.

É um acinte que hoje, 20 de abril, a secretaria da Fazendo só tenha pago três projetos pagos em 2023, o que representa R$129.437,52 quando há R$ 4.024.891,48 empenhos em aberto (101 parcelas de projetos de 3 editais). Um total descaso e desrespeito aos tantos trabalhadores da cultura precisam sobreviver. É um vexame que o terceiro estado mais desigual do país, ao invés de alimentar esse fundo, vá minguando os recursos. Já que um dia a Lei de 2017 dizia que o orçamento mínimo era de 36 milhões, e que agora é de 32 milhões.

Em Pernambuco o investimento em cultura é reverso. Não sei a que índices econômicos o governo se baseia. Se fosse corrigido pelo IPCA, hoje o edital do Funcultura seria de 49,2 milhões de reais. O edital do ano passado foi lançado apenas esse ano, com um cronograma que, sabemos, não permitirá o desembolso de recursos ainda em 2023. Afora que governo do estado vai precisar lançar outro edital ainda esse ano para fazer cumprir a lei.

Ainda assim, com uma luta descomunal de artistas, trabalhadores de toda essa cadeia, a cultura resiste. E foram muitos pernambucanos que contribuíram para a aprovação da Lei Paulo Gustavo. A LPG é uma lei de caráter emergencial. Mas o governo fascista de Bolsonaro, vetou, atrasou todo o processo. Pernambuco vai receber 184 milhões, desses 99 milhões de execução pelo Governo de Pernambuco.

É preciso destacar que a lei já traz as rubricas, sendo 70% para audiovisual e 30% para outras linguagens, divididos assim:

  • Produção – 48 milhões
  • Salas de cinema – 11 milhões
  • Formação e mostras – 5,5 milhões
  • Micro e pequenas empresas e distribuição – 8,4 milhões
  • Outras linguagens – 26,3 milhões

O estado terá muito trabalho e a regulamentação que será lançada na próxima semana vai autorizar que ele utilize 3 a 5% desse recurso para contratação de pessoal para gerir esse recurso.

Mas precisamos que se faça cumprir a LPG quando ela afirma que o ente da federação precisa fazer busca ativa a grupos vulneráveis, de pessoas que desenvolvem atividades técnicas e para o setor de culturas populares e tradicionais e as propostas oriundas desses grupos poderão ser apresentadas por meio oral, registradas em meio audiovisual e reduzidas a termo pelo órgão responsável pelo instrumento de seleção.

A LPG pretende democratizar o acesso ao fomento quando ressalta que os estados, na implementação das ações emergenciais previstas neste artigo, deverão estimular a desconcentração territorial; que precisa assegurar mecanismos de estímulo à participação e ao protagonismo de mulheres, de negros, de indígenas, de povos tradicionais, inclusive de terreiro e quilombolas, de populações nômades, de pessoas do segmento LGBTQIA+, de pessoas com deficiência e de outras minorias, por meio de cotas, critérios diferenciados de pontuação, editais específicos ou qualquer outro meio de ação afirmativa que garanta a participação plena.

A LPG também defende a desburocratização com prestação de contas que poderá ser feita em 3 categorias in loco; por relatório de execução do objeto; ou por relatório de execução financeira. Projetos com valor inferior a R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), nos casos em que o ente da Federação considerar que uma visita de verificação pode ser suficiente para aferir se houve o cumprimento integral do objeto.

Sabemos que o audiovisual brasileiro representa um mercado que agrega R$ 25 bilhões/ano ao PIB, gera aproximadamente R$ 3,5 bilhões em impostos e emprega mais de 300 mil pessoas. Não temos números e dados com relação ao setor no estado, precisamos de indicadores porque sabemos que, de novo, não se faz política pública se dados.

Estamos todos como muita esperança e gana para fazer esse recurso chegar a tantos artistas e trabalhadores da cultura que precisam. Estamos acompanhando o esforço do MINC e do governo Lula para que chegue o quanto antes. Mas sabemos que todos esses recursos são federais. O Governo Lula está fazendo a sua parte. Precisamos que o Governo de Pernambuco faça a sua na implementação e para além disso, que avance não só se adaptando ao SNC, mas também apresentando qual o seu plano político e estruturador para a cultura do nosso estado. Para que a rima que vem do sertão, que brota do barro do chão; de mãos dadas se junta à ciranda de Lia e ganhe as telas. Alimentando o nosso povo de comida, de sonhos e de futuro.

*Trabalhadora da cultura, membra do Comitê da Lei Paulo Gustavo PE, codeputada das Juntas (2019/2022)

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