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Quatro candidatos com sobrenomes de peso e muito dinheiro disputam vaga no 2º turno em Pernambuco

Crédito: Arnaldo Sete/MZ Conteúdo

É uma situação inédita em Pernambuco: faltando poucos dias para a eleição, quatro candidatos estão tecnicamente empatados dentro da margem de erro e disputam voto a voto uma vaga no segundo turno. Oscilando entre 30 e 35%, a candidata Marília Arraes (SD) tem ficado na dianteira das pesquisas. Segundo o mais recente levantamento do Ipec, divulgado nesta terça-feira (27), ela lidera com 34%. Na sequência, vêm Raquel Lyra (PSDB), com 15%, Miguel Coelho (União Brasil) e Danilo Cabral (PSB), empatados numericamente com 13%, e Anderson Ferreira (PL), com 11%.

Todos os cinco fazem parte de famílias de políticos e três deixaram os cargos de prefeitos para concorrer ao governo. Esta é uma disputa de sobrenomes fortes e legados (e máquinas) igualmente potentes. E, ao que tudo indica, só será definida no próprio domingo (2).

“São candidaturas competitivas, cada uma em um aspecto. Não é possível identificar qual será a que tem mais força para disputar o segundo turno com Marília Arraes, que vem tendo uma queda, já esperada, pois ela é o centro do ataque das outras candidaturas”, diz o cientista político Antônio Torres, doutorando na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). “Miguel Coelho é muito forte no Sertão do São Francisco, Raquel no Agreste, Anderson em Jaboatão e região metropolitana. Danilo tem a máquina do PSB, que, se a gente for observar as últimas eleições, pode dar o empurrão final para ele conseguir chegar ao segundo turno”, afirma.

Marília sai na frente, acredita Torres, por ter participado da eleição de 2020. “Ela tem um recall forte do embate com João Campos (PSB) pela Prefeitura do Recife. O eleitor lembra dela. Os outros precisaram se apresentar ao eleitorado da capital”, explica. Para se manter na dianteira, ela recebeu pouco menos de R$ 8,7 milhões dos partidos de sua coligação.

Para o cientista político, é a repercussão dos debates desta semana e a força da mobilização das campanhas no próprio domingo (2) que irão fazer a diferença nas urnas. “Em todas as eleições, acabamos vendo essas ações no próprio dia da votação, que são consideradas, inclusive, ilegais. E só domingo mesmo vamos conseguir saber qual desses candidatos vai conseguir chegar ao segundo turno”, diz.

Torres afirma ainda que não vai ser uma surpresa se, na abertura das urnas, os quatro candidatos ficarem bem distantes entre si. “O eleitor pode fazer um voto de último momento e pode ser que as candidaturas fiquem longe uma das outras”, acredita.

Também doutoranda em Ciência Política pela UFPE, Marcelle Amaral destaca que, na eleição presidencial, as pesquisas espontâneas de voto mostram historicamente que o eleitor forma sua opinião bem antes do que para a disputa local. “Isso dá uma margem de manobra com que a maioria dos candidatos conta realmente até o último dia”, coloca. “Como é questão de poucos pontos de diferença, qualquer voto está contando”, frisa.

Ela lembra que um outro aspecto precisa ser levado em consideração: os índices de rejeição. A pesquisa Ipec reafirmou, nesta terça (27), que Anderson e Danilo seguem com os piores resultados quando o eleitor é perguntado em quem não votaria de jeito nenhum, com 23% de rejeição cada. Marília tem 21% e Miguel e Raquel estão ambos com 12%. Nas simulações de segundo turno, a última Ipec mostrou que Marília vence todos os outros candidatos.

Marcelle comenta ainda sobre o clima de alerta instaurado após o vazamento da planilha apócrifa chamada de “Dia D”. “O caso dá maior atenção a como será o uso das estruturas”, acredita. Atribuído pela oposição à campanha de Danilo, o documento traz uma espécie de esquema de pirâmide de uso da máquina pública do estado e da Prefeitura do Recife, com o nome de secretários e comissionados e quantas pessoas cada um deveria levar para votar ou pedir votos para o candidato no domingo.

PSB nega uso da máquina

Os candidatos opositores ao Governo do Estado pediram investigação da Justiça Eleitoral no caso do “Dia D”. Eles pedem que também sejam tomadas medidas contra Adriano Danzi de Andrade, secretário-executivo de Planejamento do Estado, apontado, segundo a petição feita pela coligação, como autor da planilha, segundo os metadados extraídos do documento.

A campanha de Danilo, por sua vez, diz desconhecer a origem do documento e afirmou, em nota ao Jornal do Commercio, que “desde o início do processo eleitoral, recebe de militantes e eleitores sugestões de atuação, sem a obrigatoriedade de acatá-las”. É importante ressaltar que a receita oficial da majoritária do PSB passa de R$ 12,2 milhões, dos quais quase R$ 10 milhões já estariam comprometidos.

O candidato do PSB também fez acusações de uso da máquina contra Marília, numa ação de investigação que pede a cassação dela e do candidato a vice-governador Sebastião Oliveira (Avante), por causa de um ato realizado em Tacaratu, no Sertão, em julho, ainda durante a pré-campanha, envolvendo o prefeito do município, Washington Ângelo, e a então secretária de Educação, Margarete Freire Rodrigues. Segundo a denúncia, houve convocação de funcionários da cidade contratados para se engajarem em evento político em favor de Marília.

O coordenador jurídico da coligação da candidata líder nas pesquisas, Walber Agra, afirma que não houve qualquer envolvimento de nenhum integrante da chapa majoritária e que, ao tomar conhecimento da conduta irregular da secretária de Educação, o prefeito abriu inquérito administrativo e de imediato exonerou a servidora. “Pernambuco inteiro sabe das inúmeras fake news que estão sendo imputadas à Coligação Pernambuco na Veia e sabe que todas elas são destituídas de amparo real”, disparou em nota.

Reta final concentra atividades na Região Metropolitana do Recife. Crédito: Arnaldo Sete/MZ Conteúdo

A influência de Lula e Bolsonaro

Em 20 de julho, Lula visitou quatro cidades de Pernambuco para apresentar Danilo Cabral como seu candidato oficial. Em três dos discursos, prometeu voltar para engrossar a campanha. Por estratégia, o ex-presidente focou a campanha no Sudeste e não deu tempo de voltar a Pernambuco, onde tem uma situação para lá de confortável, com 63% dos votos, segundo o Ipespe. E dois candidatos fazendo campanha para ele: o oficial Danilo Cabral e a oficiosa Marília Arraes.

Depois da passagem em julho, o encontro público de Danilo e Lula ocorreu apenas na semana passada, quando o socialista foi até São Paulo para gravar com Lula para seu guia eleitoral.

Já Anderson Ferreira tem contado com um apoio bem mais ostensivo do candidato dele à presidência. Com índices baixos no Nordeste, o atual presidente tem aproveitado para fazer suas famigeradas motociatas e discursos em cidades onde a rejeição dele é mais baixa, como Santa Cruz do Capibaribe – única cidade pernambucana onde ele ganhou em 2018 –, no Agreste, e em Petrolina. Seu partido é o mesmo do presidente e sua campanha conta com orçamento de, ao menos oficialmente, R$ 11,3 milhões, dos quais informou ter gasto, até agora, menos da metade.

Nos últimos 15 dias, veio duas vezes ao estado, levando ora Anderson ora Gilson Machado (PL), candidato ao Senado, de corona na sua moto. Para o cientista político Antônio Torres, Anderson está apostando nesse apoio para ir para o segundo turno, mesmo que não consiga ser eleito, já que a rejeição a Bolsonaro é grande. “O atual presidente tem ficado com uns 20% nas pesquisas, então, se Anderson conseguir converter esse eleitorado para ele, talvez consiga ir para o segundo turno”, diz.

Esse cenário seria o melhor para Marília, já que Bolsonaro e seus apoiadores possuem um teto baixo nas pesquisas em Pernambuco. “Bolsonaro pode levar Anderson para o segundo turno, mas lá vai ser o calcanhar de aquiles dele. O contrário, o pior cenário para Marília, seria disputar o segundo turno com Raquel, que tem baixa rejeição e uma gestão bem avaliada em Caruaru. E, pela rejeição baixa, tem uma facilidade maior de conseguir votos no segundo turno”, avalia Torres.

Os cenários para o primeiro turno

Para Bhreno Vieira, mestre e doutorando em ciências políticas e integrante do grupo de pesquisa Instituições, Política e Governo da UFPE, a eleição caminha para um segundo turno em que Marília Arraes enfrentará a disputa com Anderson Ferreira, Raquel Lyra ou Miguel Coelho. Ele acredita que a alta rejeição a Danilo Cabral não o levará adiante. Além disso, o especialista acredita que a oposição ao PSB é justamente o que coloca Marília em uma posição consolidada em primeiro lugar e o legado dos socialistas no estado de Pernambuco, após 16 anos de governo, inviabiliza as chances de vitória de Danilo.

O principal crescimento que o socialista teve, lembra Vieira, aconteceu justamente depois do início da campanha. Antes ele oscilava entre 4% e 8% e só depois passou dos 10% e encostou na disputa ao segundo turno. “De certa forma, esse crescimento se deu devido à sensibilidade do período de campanha e a algo recorrente, a utilização da máquina pública na campanha do PSB. E isso é muito vantajoso, mas pode ser um prêmio ou um castigo você sair como base do partido que já está no poder”, destaca.

Sobre as agendas de campanha mais focadas no Recife e na região metropolitana nesta reta final (confira mais abaixo), o cientista político acredita que isso pode trazer vantagens para as figuras de Marília, Danilo e Anderson, por serem muito conhecidas nesses territórios, e dificuldades para Miguel e Raquel, que são candidaturas com um apelo maior e mais visibilidade no interior. Ele cita que cerca de 45% do total de eleitores do estado está na Região Metropolitana.

Bandeiras devem ficar nas ruas até sábado, 1º de outubro. Crédito: Arnaldo Sete/MZ Conteúdo

Vieira lembra que algumas práticas são muito comuns no final de semana das eleições. “O sábado é conhecido como a noite da vigília porque é o período em que o eleitorado está mais atento à prática de compras de voto e as equipes dos candidatos ficam vigiando umas às outras para que não pratiquem esse crime eleitoral e, caso pratiquem, sejam denunciadas”, resgata.

Outra prática bastante comum é espalhar santinhos nas ruas, o que promove uma grande sujeira. Como muitas pessoas ainda estão indecisas, tais práticas podem terminar agregando votos, mesmo que isso seja ilegal. O aluguel de veículos para transportar e organizar caravanas para levar os eleitores aos locais de votação é outra dessas práticas criminosas.

“O final da tarde do domingo é conhecido como o período do voto dos indecisos, porque é o momento em que o eleitor que demorou a se decidir e até estava decidido a não votar pode mudar de ideia, geralmente porque é influenciado por pesquisas de boca de urna, feitas de forma ilegal, e que fazem com que esses eleitores queiram votar no ‘time que está ganhando’”, comenta o especialista.

Candidaturas focam no Recife até domingo

De agora até domingo (2), os principais candidatos vão focar as agendas no Recife e na Região Metropolitana. Marília Arraes fará uma grande caminhada pelo bairro da Boa Vista, área central da capital, com concetração a partir das 15h em frente à Câmara de Vereadores do Recife e à Faculdade de Direito. Danilo Cabral agendou uma caminhada no mesmo dia, em Casa Amarela, na zona norte, com ponto de encontro às 17h na rua Mandacaru e encerramento na Praça Joca Leal, na rua Largo de Casa Amarela.

Raquel Lyra, cuja prestação de contas não estava disponível no site do TSE no momento de fechamento deste texto, fará uma carreata de Candeias, em Jaboatão, até o Pina, em Boa Viagem, zona sul do Recife. A concentração será às 8h em Barra de Jangada, no largo entre as ruas Soure e Curcurana. Nas demais regiões do Estado, as agendas da campanha dela serão tocadas pelas lideranças políticas que a apoiam.

Miguel Coelho (UB), que dispõe de R$ 10,6 milhões (incluindo os R$ 250 mil doador por Emival Ramos Caiado, o empresário que seu pai, o senador bolsonarista Fernando Bezerra Coelho tentou tirar da lista suja do trabalho escravo) também tem compromissos focados no Recife, em Jaboatão dos Guararapes, no Paulista e em Olinda. Mas, no sábado, encerra a campanha com uma carreta em Petrolina, no sertão, cidade berço do seu núcleo familiar e político.

Anderson Ferreira, após a visita de Bolsonaro a Petrolina e Juazeiro, na Bahia, nesta terça (27), embarcou com o presidente e o candidato ao Senado Gilson Machado para Brasília. A previsão é, no retorno, nesta quarta (28), cumprir agenda de caminha em Olinda e no Recife e, até sábado, todas as agendas dele serão na RMR e em Goiana. A assessoria não deu mais detalhes.

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AUTORES
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Raíssa Ebrahim

Vencedora do Prêmio Cristina Tavares com a cobertura do vazamento do petróleo, é jornalista profissional há 12 anos, com foco nos temas de economia, direitos humanos e questões socioambientais. Formada pela UFPE, foi trainee no Estadão, repórter no Jornal do Commercio e editora do PorAqui (startup de jornalismo hiperlocal do Porto Digital). Também foi fellowship da Thomson Reuters Foundation e bolsista do Instituto ClimaInfo. Já colaborou com Agência Pública, Le Monde Diplomatique Brasil, Gênero e Número e Trovão Mídia (podcast). Vamos conversar? raissa.ebrahim@gmail.com

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Maria Carolina Santos

Jornalista pela UFPE. Fez carreira no Diario de Pernambuco, onde foi de estagiária a editora do site, com passagem pelo caderno de cultura. Contribuiu para veículos como Correio Braziliense, O Globo e Revista Continente. Ávida leitora de romances, gosta de escrever sobre tecnologia, política e cultura. Contato: carolsantos@gmail.com

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Giovanna Carneiro

Jornalista e mestranda no Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal de Pernambuco.