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Com a idade mínima permitida para se candidatar ao Senado, 35 anos, completos em 27 de setembro, Eugênia Lima é presidenta do Psol em Olinda, mãe e se autodeclara negra no TRE, diz que abriria mão de alguns privilégios como senadora, caso eleita. É formada em direito pela Universidade Católica de Pernambuco (Unicap), pós-graduada em gestão pública e mestre em desenvolvimento urbano pela UFPE. Começou a militância aos 16 anos, na campanha que levou Luciana Santos (PCdoB) à Prefeitura de Olinda.
Na universidade, sempre “inquieta”, como ela mesma se define, foi a primeira mulher a ocupar a presidência do Diretório Acadêmico de Direito – “estar ali era repensar o Direito e fazer as coisas de outra forma”. Foi, de 2004 a 2008, coordenadora de políticas públicas de juventude de Olinda. Fundou e coordenou, por 12 anos, o grupo percussivo Conchitas, formado só por mulheres e com a missão de fortalecer o empoderamento feminino.
Foi no mestrado que passou a militar pelo direito à moradia, fazendo parte da luta contra as desapropriações para a Copa de 2014 no Coque, área central do Recife, e no Loteamento São Francisco, em Camaragibe. “Aí se deu a reflexão de que a gente precisava de uma caneta na mão”, relembra. Em 2015, mobilizou um grupo de pessoas e conseguiu reverter a “camarotização” do Carnaval de Olinda. “Foi quando ficou claro que a gente precisava disputar a institucionalidade”.
Em 2016, o impeachment de Dilma e o cenário que se estabeleceu impulsionaram Eugênia a se candidatar vereadora de Olinda. Com 2.087 votos, não entrou na câmara por causa do quoeficiente eleitoral. Muitas vezes apontada como inexperiente, vê como o maior desafio de sua candidatura ao Senado em 2018 o povo saber que ela é candidata.
Pernambuco nunca teve uma mulher senadora. Eu só pude me candidatar porque fazia 35 anos em 27 de setembro. É uma ousadia do partido me colocar nesse lugar. Mas, para a gente, é uma quebra de paradigmas, ser mulher e ocupar esse espaço na idade que eu tenho. Os desafios lá são enormes, imagina com quem a gente vai dar de cara no Senado? Mas isso não nos esmorece, isso só dá mais vontade de estar na luta e na resistência e saber que você pode, sim, estar lá e ter experiência para estar nesses lugares.
Precisamos empoderar nossas mulheres para combater a desigualdade. Estando lá, temos que focar em projetos para trazer mais mulheres para a política, incentivando lideranças. A gente não pode deixar de falar que a creche é uma questão fundamental de empoderamento e precisamos discutir isso também no âmbito do pacto federativo, que compromete estados e municípios na área de saúde e educação, e é aí que se mantêm as relações de favores.
Eu sempre me declarei negra. Eu sempre militei, minha mãe é negra. Algumas pessoas não me veem negra, mas eu me vejo. Sempre vivi em movimento cultural, de resistência, tenho diálogo e frequento terreiro. Minha mãe educou a gente dizendo que a gente tinha que dizer a verdade porque a gente era negro e, se chegasse a polícia, seríamos os primeiros a ser presos. Mas claro que, dentro da negritude, eu tenho privilégios e não sofro o preconceito que outras pessoas sofrem, não estou reivindicando um lugar que eu não sofro.
Eu sempre me questionei o seguinte: a gente vota nas pessoas e depois como é que acompanha o mandato? Aqui o vereador e candidato a deputado federal Ivan Moraes tem dado um exemplo de mandato bem participativo e dialógico. Acho que esse é um dos caminhos, dar voz, prestar contas e dialogar, com mecanismos institucionais e não institucionais para a gente fazer essa prestação de contas. É preciso pensar e fazer com que o Senado saia do mofo. É também super importante repensar a democratização da comunicação.
O Psol sempre fala no combate aos privilégios. O auxílio-moradia dos senadores é de R$ 5 mil e o auxílio do povo desapropriado não chega nem a R$ 200, é muita contradição. E isso não se passa só no universo do legislativo e do executivo, a gente tem o judiciário que também é dotado de várias regalias e privilégios. Como avançar nisso com um congresso conservador? A gente pode querer não utilizar dos privilégios, mas, para combater de forma coletiva e eficiente, precisamos de um Congresso com pressão popular. Embora pareça não haver governabilidade, porque o Psol tem seis deputados federais, o que é muito pouco para os 513, a gente tem outra coisa, a postura do Psol na câmara, as ações, os projetos de lei. Eu abriria mão de tudo que pudesse abrir mão caso eleita.
A gente precisa passar por um processo de reforma urbana. O Estatuto da Cidade é lindo, mas não é efetivado. Por exemplo, o IPTU progressivo não funciona. Precisamos de medidas para acelerar a legislação que temos e também pensar em medidas emergenciais em relação ao direito à moradia, como o aluguel social. A gente tem no Recife vários lugares abandonados que não pagam impostos e poderiam ter um incentivo que tivesse um retorno para a gestão. E não podemos tratar só o urbano, a gente precisa pensar também na reforma agrária para poder avançar. E pensar também nas questões transversais. Se não pensarmos também em políticas de distribuição de renda e melhoria do serviço público, não avança.
A gente precisa mexer nisso, senão não avança. Sobre educação, precisamos pensar na questão CAQ (Coeficiente Aluno Qualidade) para que esse aluno tenha o mesmo valor e a mesma oportunidade. Tem a reforma do ensino médio, que tira disciplinas como sociologia e filosofia do ensino público, mas elas continuam lá no ensino privado.
Tudo que privatiza a gente perde muito, porque entrega para um privado que vai querer ter lucro. A Arena da Copa está aí, o estado tem que desembolsar dinheiro todo mês. Hoje acho que precisaríamos incentivar a habitação popular naquela área e criar um complexo de esporte e lazer para que a população ocupe o espaço.
É uma opção política a conta fechar com déficit. A gente tem R$ 500 bilhões de sonegação fiscal neste país. É muito dinheiro, vamos cobrar quem tem que pagar. A gente não tributa grandes fortunas, não tributa renda. Precisamos tributar mais quem tem grandes posses e propriedades, seja urbana ou rural. O modelo tributário em que a gente vive onera quem não tem. O Brasil está em déficit, mas tem R$ 358 bilhões de desonerações fiscais. E quanto é a dívida previdenciária dos bancos?!
Acho bem difícil se conseguir uma reforma tributária se a gente não renovar esse Congresso. Quem é que patrocina a não reforma? As empresas que têm perdões e desonerações fiscais. A Fiat vem para cá e não paga quase nada para se instalar aqui e tem lucro com isso. Aí você vê um desapropriado tendo que pagar um imposto sobre transmissão que é maior que a indenização que ele vai receber. A lógica é perversa.
Tem gente que fala que não há déficit da previdência. Na verdade, o que é utilizado é uma parte do dinheiro da previdência para pagar a dívida, que não acaba nunca. É até inconstitucional. A questão da sonegação, da desoneração fiscal são recursos que poderiam ser usados para outros fins, inclusive o pagamento da dívida. Muitas cidades vivem dessa aposentadoria.
Se a gente não tiver também uma reforma política, não consegue garantir mudanças. Acho que a renovação política no Congresso este ano será muito pequena, mesmo achando que a gente vai ter uma bancada socialista maior. Veja o meu exemplo: dez segundos de TV e R$ 19 mil para fazer uma campanha de Senado. Aí você vê Jarbas Vasconcelos com três minutos de TV e R$ 2 milhões. O desafio dessa candidatura é o povo saber que eu sou candidata, a gente não tem debate na TV, poucas emissoras chamam para entrevista. Então essa candidatura não está em evidência. A gente conta com as redes sociais, mas tem todos os outros candidatos que têm mandatos, nomes… E a gente encontra um problema ainda maior que é a questão do voto útil, em vez do voto digno.
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