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Editor do The Intercept Brasil foi a grande atração da abertura do seminário. Crédito: Inês Campelo/MZ Conteúdo
Editor do The Intercept Brasil, Leandro Demori foi a grande atração da abertura do seminário “Que país é esse? – Comunicação e Política em uma Democracia em Crise”, na terça-feira (1), realizado pela Universidade Federal de Pernambuco com parceria da Marco Zero Conteúdo. No auditório professor Denis Bernardes, do Centro de Ciências Sociais e Aplicadas (CCSA) da universidade, o jornalista falou sobre a Vaza Jato e as encruzilhadas da mídia, da política e da justiça.
A palestra foi mediada pela professora Maria Eduarda Rocha, da UFPE e do Programa Fora da Curva, da Rádio Universitária, e teve como debatedores o sócio-fundador da Marco Zero Conteúdo, Laércio Portela e o doutor em ciência política da USP, Sérgio Ferraz. Logo que o evento foi anunciado, as vagas para conferência gratuita de Demori esgotaram rapidamente. Eventos com a participação dele se tornaram mais disputados depois que o The Intercept passou a publicar os arquivos vazados de chats entre os procuradores do Ministério Público Federal e o ministro da Justiça, então juiz Sérgio Moro, que revelam o uso político da Operação Lava Jato.
O conteúdo das denúncias levadas a público pelo The Intercept é incisivo, e Demori não se esquiva dos questionamentos ao trabalho. O jornalista, que anda acompanhado por um segurança por sofrer ameaças, tem participado de debates em universidades e já participou de audiência sobre a Vaza Jato na Câmara dos Deputados, em Brasília. Também enfrentou os que são abertamente críticos às reportagens, como o apresentadores do programa Pânico, na rádio Jovem Pan.
Nesses espaços, o jornalista quase sempre é questionado sobre o envolvimento do The Intercept Brasil com hackers, que seriam as fontes das mensagens vazadas. Na palestra da UFPE não foi diferente. Demori revirou os olhos, mas aproveitou a pergunta para reafirmar o direito dos jornalistas de “receberem denúncias de fontes anônimas e de publicar informações que sejam de interesse público”. E, sobre o trabalho do The Intercept, reafirmou a opção pelo jornalismo de impacto. “Se não incomoda ninguém, não serve pra nada”, disse.
Ainda aproveitando o mote da pergunta, o editor alfinetou: “Ninguém pergunta ao Antagonista, à Crusoé ou ao Fausto do Estadão se eles compraram o inquérito dos hackers que corre em segredo de Justiça”. Ele se referia às matérias baseadas em vazamentos de depoimentos de supostos hackers. No Twitter, ele havia comentado horas antes que a trama foi empacotada “como se nós (os jornalistas do Intercept) fossemos criminosos”.
Sobre a Vaza Jato e o papel da imprensa, Demori contextualizou que cenário político que se construiu no Brasil a partir dos protestos em 2013, também conhecidos como jornadas de junho, criou um ambiente ideal para que a Operação Lava Jato dominasse a narrativa midiática. “A Lava Jato ofereceu, durante cinco anos, notícia gratuita com um alto poder explosivo. Eles criaram uma massa de informação e deram à população a oportunidade de visualizar apenas uma parte”, argumentou, assinalando os desvios na condução da operação, que estão sendo comprovados nas reportagens publicadas pelo The Intercept, em parceria com vários veículos jornalísticos brasileiros.
Deltan Dallagnol, procurador do MPF, é o principal alvo das denúncias da série de reportagens. O conteúdo vazado revela que Deltan fez da Lava Jato uma espécie de ‘guerra santa’, na avaliação do jornalista. “Ele tinha um raciocínio religioso onde a corrupção era o mal e era o demônio”, explicou. Esse raciocínio e a perseguição ao ex-presidente ficam evidentes quando se sabe que o nome está citado 14.357 vezes nos arquivos da Vaza Jato. Isso sem contar com os apelidos dados ao fundador do PT. “Eles construíram uma narrativa pública de modo que muitas pessoas acreditam que personifica a corrupção. Enquanto ele está preso, não há corrupção”, observou.
Nessa ‘luta do bem contra o mal’, a Lava Jato se tornou intocável. Quem se colocava contra ou era corrupto, ou a favor da corrupção. Isso valia inclusive para a própria imprensa, que publicava os conteúdos divulgados pela Força-Tarefa da operação sem questionamentos, na opinião de Demori. O grampo telefônico que revelou conversas entre a então presidente (PT) e , que foram divulgados na GloboNews, por exemplo, estavam entre “mais de 20 grampos telefônicos desconhecidos que foram enterrados. Apenas um foi ao ar”, destacou.
Questionado sobre os impactos da Vaza Jato na política brasileira, o editor do The Intercept disse que não espera a demissão do ministro da Justiça Sérgio Moro. No entanto, ele considera que as derrotas sofridas por ele na Câmara dos Deputados, como no caso da tramitação do “pacote anticrime”, por exemplo, já são uma consequência direta do desgaste da imagem do principal ministro do governo de Jair Bolsonaro (PSL), a partir das revelações das reportagens.
Seminário
Até a próxima quinta-feira (3), o seminário “Que país é esse? – Comunicação e Política em uma Democracia em Crise” segue debatendo o momento político brasileiro. A programação ainda conta com nomes como o do professor Vladimir Safatle, da USP, que lançará o livro “Dar corpo ao impossível: o sentido da dialética a partir de Theodor Adorno”, durante o evento.
Nesta quinta-feira (3), o papel das formas de comunicação alternativas no “ecossistema” de mídias do Brasil será debatido por Inácio França, sócio-fundador da Marco Zero Conteúdo, com Ana Veloso, do Obmídia e ex-integrante do Conselho Curador da EBC) e Paula , do Programa Fora da Curva e da Rádio Universitária Paulo Freire) e Gustavo Almeida, da Empresa Pernambuco de Comunicação – EPC. Os horários de todas as palestras podem ser consultados aqui.
O seminário também acontece em comemoração ao aniversário de quatro anos da Marco Zero Conteúdo e dos três anos do Programa Fora da Curva. As conferências estão sendo exibidas ao vivo no canal da UFPE no Youtube e no Facebook do Programa Fora da Curva.
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Jornalista formada pela Universidade Católica de Pernambuco (Unicap) e pós-graduada pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Foi repórter de Economia do jornal Folha de Pernambuco e assinou matérias no The Intercept Brasil, na Agência Pública, em publicações da Editora Abril e em outros veículos. Contribuiu com o projeto de Fact-Checking "Truco nos Estados" durante as eleições de 2018. É pesquisadora Nordeste do Atlas da Notícia, uma iniciativa de mapeamento do jornalismo no Brasil. Tem curso de Jornalismo de Dados pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e de Mídias Digitais, na Kings (UK).