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Crédito: Procon-PE/Divulgação
Dez meses após os primeiros casos de Covid-19 no estado, o Conselho Regional de Medicina (Cremepe) decidiu se pronunciar em relação às medidas do Governo de Pernambuco no combate ao Sars-CoV-2. Em nota enviada à imprensa, a entidade sugere que a gestão Paulo Câmara (PSB) está ignorando os dados epidemiológicos que apontam “para um crescimento expressivo de infectados e mortos nas próximas semanas”.
O Cremepe avalia que para além das medidas tomadas nos últimos meses, como a ampliação de leitos hospitalares, o governo pernambucano está enviando uma mensagem errática para o cidadão e acaba se contradizendo. “[São] ineficientes as medidas recentemente anunciadas pelo governo. Consideramos ainda, incompreensível a permissão para reuniões, comemorações, festividades, bem como a frequência de bares e restaurantes”, diz a nota.
A manifestação do conselho, que expõe ainda a exaustão dos médicos diante do aumento da circulação do novo coronavírus e, consequentemente, de pacientes, coincide com a mudança no discurso do governo estadual. Quem acompanha as lives, chamadas de coletivas de imprensa, conduzidas pelo secretário de Saúde, André Longo, tem notado que o tom de alerta há semanas deu lugar à minimização dos dados. As falas têm enfatizado apenas a responsabilidade do cidadão.
A pasta também reduziu, pelo menos desde a campanha eleitoral, a frequência de transmissões on-line onde o secretário responde perguntas enviadas previamente por jornalistas em um grupo de WhatsApp. Esse modelo de prestação de contas à sociedade por meio da imprensa não permite que o secretário seja confrontado. Esses pronunciamentos diários na maior parte da pandemia agora acontecem no máximo duas vezes por semana. O plano de convivência com o coronavírus do próprio governo previa o retorno das coletivas a partir de 3 de novembro, início da etapa 11, mas ainda não aconteceu.
“Nunca foi tão difícil fazer chegar à população a verdadeira dimensão da pandemia que nos assola. Uma campanha massiva envolvendo as instituições civis organizadas, deve ser viabilizada de imediato. Mais do que nunca os meios de comunicação devem ser alimentados com dados baseados em trabalhos científicos robustos, de fontes confiáveis, combatendo o ‘negacionismo’ e as ‘fake news’ que em nada contribuem para o bem da sociedade”, reclama o Cremepe.
O conselho pede o endurecimento das regras de circulação a partir da revisão do plano de convivência com o coronavírus e a proteção dos profissionais de saúde que têm sofrido “com contratos precários e a falta de materiais de proteção e insumos”.
A SES rebate o Cremepe dizendo que atua com “total transparência” e baseada em dados epidemiológicos e evidências científicas. Também em nota, a pasta alega que “não hesitará em tomar qualquer medida mais restritiva, caso seja necessário diante dos indicadores”. (Veja a nota na íntegra no final da matéria)
A declaração do Cremepe foi alvo de críticas de médicos e outras organizações formadas pelos profissionais. O posicionamento é visto como tardio – Pernambuco já contabiliza mais de 211 mil casos de infecção pelo Sars-CoV-2 e quase 9.500 vítimas fatais da Covid-19. O conselho também é criticado por fazer uma avaliação parcial da crise, isentando o governo federal de suas responsabilidades.
A médica sanitarista e vice-presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Bernadete Perez, considera a nota do Cremepe correta “nos termos”, mas avalia que ela “chegou muito tarde”. A especialista, que também é professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), destaca que o texto do conselho não aponta a corresponsabilidade do negacionismo e da falta de respostas coordenadas.
“Essas respostas não podem ser só clínicas com construção de hospitais, mas também nas dimensões da atenção primária, vigilância epidemiológica e seguridade e proteção social, nós não tivemos até hoje. A nota nega a corresponsabilidade do governo federal. Existe o negacionismo do estado, mas qual o papel do governo federal para coordenar as respostas, inclusive agora com a vacina?”, questiona a médica.
A professora da UFPE e coordenadora do núcleo estadual da Associação Brasileira de Médicas e Médicos pela Democracia, Ana Brito, diz se sentir frustrada com a nota do Cremepe. Pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz, a médica salienta também a omissão do conselho ao longo da pandemia em relação ao governo federal e, no âmbito estadual, a atuação pouco efetiva contra “médicos obscurantistas”.
“É sempre importante que uma entidade de classe se manifeste, não ignoro essa importância, mas o Cremepe não cobra a responsabilidade fundamental que era a centralização das ações no governo federal para o combate à pandemia, exatamente como prevê nossa Constituição Federal”, afirma.
“Irônico como o Cremepe fala em negacionismo, mas não pune os médicos que agem com charlatanismo receitando hidroxicloroquina, ivermectina e outros remédios comprovadamente ineficazes contra a Covid-19. São oito meses que o conselho de ética não toma uma atitude, colocando as pessoas em risco”, completa a coordenadora.
A Secretaria Estadual de Saúde (SES-PE) esclarece que, desde o início da pandemia, o Governo de Pernambuco tem atuado com total transparência e que todas as medidas de enfrentamento ao novo coronavírus têm sido tomadas com base em dados epidemiológicos, evidências científicas e indicadores da doença. Assim, o Estado tem procurado adotar medidas proporcionais ao cenário epidemiológico por meio das verificações diárias dos indicadores.
Nas últimas semanas, o Governo de Pernambuco anunciou a proibição de shows, festas e similares e, na avaliação da última semana epidemiológica, a decisão foi por intensificar os processos de fiscalização. Com isso, o Comitê de Enfrentamento à Covid-19 do Governo do Estado enviou recomendação para que os municípios pernambucanos intensifiquem e ampliem a fiscalização no cumprimento dos protocolos do Plano de Convivência com a doença a fim de coibir as situações de descumprimento dos protocolos e também para conscientizar a população. O foco da medida são locais públicos como parques, praças, praias, que vêm registrando seguidamente aglomerações sem a observação do uso de máscaras e a manutenção do distanciamento social, além de bares, restaurantes e casas noturnas.
A SES-PE informa, ainda, que, mesmo antes dos primeiros casos do novo coronavírus no Estado, o Governo de Pernambuco trabalhou para preparar a rede de saúde para o atendimento à população. É oportuno lembrar que a SES-PE elaborou, junto às unidades de saúde da rede, um conjunto de ações para auxiliar os profissionais sobre o fluxo de atendimento para casos suspeitos da doença, seguindo todos os protocolos preconizados pelo Ministério da Saúde. Desta forma, as unidades criaram áreas destinadas ao atendimento exclusivo de pacientes suspeitos da Covid-19 em suas emergências e enfermarias, com o objetivo de evitar o contato entre os pacientes suspeitos e não suspeitos, além de proteger os profissionais de saúde que atuam nestes casos.
A Secretaria Estadual de Saúde também tem monitorado permanentemente o abastecimento e os estoques de equipamentos de proteção individual (EPIs) das unidades da rede estadual de saúde de todo o Estado e deflagrado ações para garantir a compra de itens de acordo com as especificações técnicas recomendadas pelos órgãos de controle, visando garantir a segurança do profissional de saúde e dos pacientes.
Por fim, a Secretaria Estadual de Saúde ressalta que o monitoramento do cenário epidemiológico e dos indicadores da Covid-19 continua sendo feito diariamente e o Governo de Pernambuco não hesitará em tomar qualquer medida mais restritiva, caso seja necessário diante dos indicadores.
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Jornalista formado pela Unicap e mestrando em jornalismo pela UFPB. Atuou como repórter no Diario de Pernambuco e Folha de Pernambuco. Foi trainee e correspondente da Folha de S.Paulo, correspondente do Estadão, colaborador do UOL e da Veja, além de assessor de imprensa. Vamos contar novas histórias? Manda a tua para klebernunes.marcozero@gmail.com