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Atacadão de Olinda, do Grupo Carrefour, é alvo de denúncia de racismo

Raíssa Ebrahim / 14/04/2023
Fachada da loja Atacadão, em Olinda

Crédito: Arnaldo Sete/MZ Conteúdo

O Grupo Carrefour foi alvo de denúncia de racismo outra vez. O assistente administrativo e estudante olindense Pedro Freire, 24 anos, relatou nas redes sociais que sofreu perseguição por parte de seguranças no Atacadão (pertencente ao grupo) em Olinda na última terça-feira (11). O maior empregador privado do Brasil, com mais de 150 mil colaboradores.

Cliente do mercado, ele conta que costuma ir à unidade todos os meses e, desta vez, após perguntar se poderia entrar com uma bolsa com sacolas dentro, que serviriam para carregar a feira, foi autorizado por uma funcionária da loja. Eram 9h30. Pedro relata que entrou na loja, percorreu alguns poucos corredores e começou a ser seguido por um segurança. Em poucos minutos, estava sendo observado e seguido por mais dois seguranças, sendo uma mulher.

“Foi quando eu abordei e disse ‘o que está acontecendo? Já são três seguranças atrás de mim. Eu venho aqui todo mês fazer feira, frequento aqui há anos, nunca me aconteceu isso. Eu estou aqui com sacolas dentro dessa bolsa. Não é nada, não”, disse aos funcionários, constrangido. Logo em seguida, Pedro abriu a bolsa e jogou tudo no chão para mostrar que eram apenas sacolas.

“Logo após isso acontecer, eu fui atrás da gerência. Eles não me deram um amparo correto, só pediram calma, quando eu estava ali fragilizado, tendo a minha dignidade e honestidade jogada assim ao léu, questionada, quando estava ali honestamente comprando, e eu tenho testemunha” diz no vídeo postado, bastante abalado.

“Foi muito agressiva essa situação, muito agressiva”, detalha. Pedro afirmou que está sendo assistido jurídica e psicologicamente. À Marco Zero, ele disse, nesta sexta (14), que está procedendo com o Boletim de Ocorrência. “Mas outras inúmeras pessoas passam por isso todo dia e se calam”, lamenta.

O que diz o Atacadão

Em nota enviada à Marco Zero, o Atacadão pediu “profundas desculpas” pelo caso de Pedro e informou que está investigando o ocorrido, ao mesmo tempo em que reforça o comprometimento com novas medidas implementadas na quarta (12), um dia depois.

Confira as medidas informadas pelo Atacadão e a íntegra da resposta sobre o caso em Olinda:

A rede Atacadão lamenta profundamente os casos ocorridos e informa que, no processo contínuo de evolução para que casos de racismo ou qualquer outro tipo de discriminação não ocorram em suas lojas ou qualquer das suas atividades, analisou mais uma vez os seus protocolos internos e tomou a decisão de implementar as seguintes novas medidas:

• Fica interrompida a atividade de circulação dos funcionários fiscais de prevenção em suas lojas. Ou seja, não há mais circulação destes profissionais de prevenção nos corredores. A medida foi implementada na última quarta-feira, 12, e é válida para todas as lojas;

• Os profissionais que antes circulavam pelas lojas ficarão à disposição dos clientes em pontos fixos e pré-determinados, na frente do caixa ou em sala que possui o circuito fechado de televisão (CFTV). A função dos profissionais que ficam em pontos fixos ou à frente do caixa é ser ponto de apoio aos clientes, ou atuação em casos de urgência (clientes passando mal e acidente, por exemplo).

• Serão realizadas melhorias no processo de monitoramento de câmeras para manter um ambiente seguro para seus clientes;

• Realizará a revisão de treinamentos de suas equipes de loja em parceria com a Universidade Zumbi dos Palmares;

• Promoverá a ampliação da visibilidade dos canais de denúncia.

A rede Atacadão reitera o respeito aos mais de 5 milhões de clientes que recebe em suas lojas por semana, bem como seu compromisso com a mudança e combate ao racismo e qualquer tipo de discriminação, e permanece em processo de escuta ativa e segue revisando os processos internos.

Sobre o caso em questão, ocorrido um dia antes da implementação das novas medidas, pedimos profundas desculpas, informamos que estamos no processo de investigação e reforçamos o comprometimento com as medidas citadas para que isso não aconteça.

Outros casos

Há uma semana, na sexta-feira, 7 de abril, o advogado negro Vinícius de Paula, marido da jogadora de vôlei Fabiana Claudino e filho do contor e apresentador Netinho de Paula, acusou a empresa de racismo após uma atendente se recusar a atendê-lo em uma unidade do mercado em Alphaville (SP). Ele tentou passar as compras pelo caixa preferencial de idosos, que estava vazio, mas a funcionária informou que não podia. Pouco depois, quando ele estava em outro caixa, viu uma mulher branca e jovem ser atendida no mesmo caixa preferencial.

A gerência do Carrefour afastou imediatamente a colaboradora, que estava em período de experiência e depois foi desligada no mesmo dia. “Acolhemos o cliente no momento do ocorrido, tendo seguido em contato com ele desde então – e continuamos abertos ao diálogo. Temos uma política de tolerância zero contra qualquer tipo de comportamento desrespeitoso, além de promover esforços constantes na conscientização dos nossos colaboradores”, disse a empresa em nota.

A assessoria de imprensa informou ainda que, “nos últimos dois anos, o Carrefour assumiu a responsabilidade de fazer uma transformação de dentro para fora no combate ao racismo estrutural no país, com investimento de mais de R$ 115 milhões em ações a favor do empreendedorismo negro e na área de educação. Por exemplo, todos os nossos colaboradores são constantemente capacitados para uma postura antirracista; lançamos o maior programa de bolsas de estudo e permanência privadas do país, para graduação, mestrado e doutorado de pessoas negras; e recentemente firmamos uma parceria com a Faculdade Zumbi dos Palmares para criação do primeiro curso de nível superior para formação de profissionais antirracistas na área de segurança”.

Dois dias depois do caso de Vinícius, a professora Isabel Oliveira afirmou que foi seguida de forma intimidatória por um segurança enquanto fazia compras em uma unidade do Atacadão em Curitiba. Em protesto, ela voltou ao mercado e ficou seminua, apenas de calcinha e sutiã, e escreveu no corpo a pergunta “sou uma ameaça?”, para demonstrar que não estava escondendo nenhum produto. As imagens do protesto viralizaram nas redes sociais. O funcionário prestou depoimento à Polícia Civil do Paraná e negou a perseguição.

A companhia disse que “abriu apuração interna sobre o caso e suspendeu o funcionário indicado pela senhora Isabel durante esse período de investigação. Imagens internas das câmeras da loja serão disponibilizadas às autoridades”.

Na segunda-feira após o feriadão de Semana Santa, quando os casos ocorreram, o presidente Lula criticou publicamente o Carrefour garantindo que isso não seria tolerado no país. A declaração ocorreu durante reunião de cem dias de governo com ministros e líderes no Congresso, no Palácio do Planalto.

Em 2020, João Alberto Silveira Freitas, homem preto, foi espancado até a morte no Carrefour em Porto Alegre. Na época, seis pessoas foram denunciadas e indiciadas por homicídio triplamente qualificado. O caso tramita em segredo de Justiça e os réus irão a juri popular.

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AUTOR
Foto Raíssa Ebrahim
Raíssa Ebrahim

Vencedora do Prêmio Cristina Tavares com a cobertura do vazamento do petróleo, é jornalista profissional há 12 anos, com foco nos temas de economia, direitos humanos e questões socioambientais. Formada pela UFPE, foi trainee no Estadão, repórter no Jornal do Commercio e editora do PorAqui (startup de jornalismo hiperlocal do Porto Digital). Também foi fellowship da Thomson Reuters Foundation e bolsista do Instituto ClimaInfo. Já colaborou com Agência Pública, Le Monde Diplomatique Brasil, Gênero e Número e Trovão Mídia (podcast). Vamos conversar? raissa.ebrahim@gmail.com