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Imagine que você e sua família decidam visitar uma pequena vila no litoral nordestino e, para entrar no vilarejo, tenham de pagar uma taxa de R$ 50,00 para uma empresa privada que controla a região? Pois é isso que a Urbia Cataratas, concessionária responsável pela gestão de 7.850 hectares do Parque Nacional de Jericoacara, no Ceará, pretende fazer na Vila de Jericoacoara.
O caso foi parar na Justiça, que suspendeu a cobrança temporariamente. O recurso da Urbia, que pretende manter a cobrança da taxa de acesso à vila, será julgado na próxima terça-feira, 23 de setembro, no Tribunal Regional Federal – 5ª Região (TRF-5), no Recife.
Contra a cobrança estão o Ministério Público Federal (MPF), que já emitiu parecer contrário, a prefeitura do município de Jijoca de Jericoacoara e a população da vila. De acordo com o MPF, a imposição da taxa não encontra amparo legal e representa um risco direto ao direito constitucional de ir e vir da população local, bem como dos visitantes.
Para o Conselho Comunitário da Vila de Jericoacoara, lutar contra a taxa é fundamental não só por causa dos impactos econômicos, mas também para garantir “os princípios da justiça social e da garantia de direitos fundamentais”. É isso que diz a nota distribuída pelo Conselho, que, com ajuda da prefeitura e dos empresários da vila, contratou uma assessoria de imprensa profissional.
De acordo com Lucimar Marques (foto), representante do Conselho Comunitário, a preocupação também é com os moradores dos municípios vizinhos que tiram seu sustento do movimento gerado pelo turismo do parque nacional. “Não tem nem como calcular o tamanho do impacto que a gente pode sofrer caso essa cobrança indevida aconteça, e os mais prejudicados vão ser os trabalhadores porque a Vila de Jericoacoara mantém trabalho para o município todo e para os municípios vizinhos”, queixa-se.
Segundo ela, a empresa se instalou na cidade disposta a fazer a cobrança, mas, nos debates públicos com a comunidade, ficou acertado que só iria cobrar taxas dos turistas interessados em acessar as atrações do parque nacional, como a Pedra Furada, a Árvore da Preguiça ou a Duna do Pôr do Sol. Lucimar preocupa-se com outros danos sociais e culturais: “Além de afastar os turistas da vila, que são ganha-pão, a taxa traz outro impacto: porque os nossos amigos e parentes que vêm visitar em nossas casas também vão ser prejudicados”.
Nesta sexta-feira e sábado, duas manifestações de rua vão parar a Vila de Jericoacoara em protesto contra a empresa concessionária e chamar a atenção da opinião pública. Ao contrário do que costuma acontecer em mobilizações sociais, as passeatas contarão com apoio da prefeitura e dos comerciantes locais.
A maior preocupação do prefeito Leandro Cézar (PP) é com o desemprego. Ele acredita que essa será uma consequência imediata da cobrança da taxa pela Urbia Cataratas: “Vai haver uma redução brusca no movimento cotidiano da vila, então isso vai levar o empresariado a demitir de forma rápida porque não se vai contratar ou manter funcionários se não há visitantes para locar quartos, para ir no restaurante, para fazer o passeio. Vai impactar não só o pequeno, vai impactar o grande, vai impactar toda a cadeia econômica”.
O prefeito repetiu a versão de que a Urbia Cataratas não cumpriu o combinado, fazendo coro com Lucimar. “O que foi prometido é que a cobrança seria apenas nos pontos de visitação, mas querer cobrar das pessoas simplesmente por ir à Vila de Jericoacoara, que não pertence à concessão, vai trazer consequências drásticas”, queixa-se o prefeito.
A presidente do Conselho Empresarial de Jericoacoara, Delphine Estevenet, acredita que a cobrança seria “dramática”. Segundo ela, “os turistas não iriam permanecer na vila, no melhor dos casos passariam um único dia em Jeri e ficariam se hospedando em outros lugares. Os municípios vizinhos também sofreriam um impacto enorme, porque sabemos que hoje Jericoacoara desenvolve os empreendimentos na região inteira. Por isso que a comunidade está tão desesperada e se movimentando com tanta força.”
A concessionária enviou nota oficial à imprensa explicando que a “cobrança possui respaldo contratual”. Leia a nota da empresa na íntegra:
A Urbia Cataratas Jeri informa que as regras do contrato de concessão do Parque Nacional de Jericoacoara foram definidas pela União e devem ser cumpridas pela concessionária, vencedora do processo licitatório. O contrato prevê investimento de R$ 116 milhões em infraestrutura e operação ao longo de 30 anos, sendo R$ 90 milhões nos primeiros anos, com foco em modernização, conforto, segurança e sustentabilidade.
A cobrança de ingresso possui respaldo contratual e é essencial para garantir a conservação ambiental, a manutenção da infraestrutura e a qualificação da experiência turística. Todas as intervenções contam com autorização do ICMBio, validação judicial e seguem os trâmites legais e técnicos exigidos.
Moradores da Vila de Jericoacoara, bem como trabalhadores e prestadores de serviços de Jijoca, Camocim e Cruz, terão acesso gratuito 24 horas por dia. Reafirmamos nosso compromisso com a legalidade, a transparência e o uso público sustentável do Parque, em diálogo com órgãos competentes e a sociedade.”
Turistas precisam pagar taxa para visitar a Pedra Furada
Crédito: Divulgação
Jornalista e escritor. É o diretor de conteúdo da MZ.