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Deputada Roberta Arraes homenageia desembargador Fausto Campos com Título de Cidadão de Pernambuco (Crédito: Reprodução Internet)
Mais de 70% dos projetos de lei apresentados pelos deputados estaduais da Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe) durante a legislatura passada foram para prestar homenagens, fazer celebrações e dar nome a espaços públicos e/ou rodovias. O levantamento é da ONG Cidadão Fiscal, que mapeou 522 projetos nestas categorias no período de 2015 a 2018 com auxílio de inteligência artificial.
Do total pesquisado, 211 foram homenagens, incluindo entregas de títulos de cidadão de Pernambuco, de medalhas comemorativas e de outras honrarias. Outros 235 foram celebrações, como a instituição do Dia Estadual do Skate, e 76 foram nomeações de espaços. Desse último grupo, 12 projetos colocavam o nome do ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos em prédios públicos e/ou rodovias.
A ONG Cidadão Fiscal usou os dados colhidos para montar um ranking dos dez parlamentares que mais apresentaram projetos dentro dessas vertentes. A deputada estadual reeleita Roberta Arraes (PP) lidera a lista dos “dez mais” com 25 projetos deste tipo, 84% das suas 30 propostas. Entre os exemplos dos projetos apresentados ( e aprovados) por ela durante o período analisado pela ONG é possível encontrar no portal Alepe Legis um que nomeia a Companhia Independente de Polícia Militar com sede em Araripina, município onde a parlamentar é radicada, de “Companhia Independente Governador Miguel Arraes de Alencar”.
No atual mandato, Roberta já apresentou 12 projetos. Quatro deles podem ser classificados como homenagens, premiações e nomeações. Um exemplo é a concessão do prêmio internacional país amigo de Pernambuco ao Estado de Israel.
O segundo lugar do ranking das homenagens ficou com o ex-deputado estadual Ricardo Costa (PP), antigo PMDB e atual superintendente de comunicação da Casa Legislativa. Ele teve 22 propostas nessas categorias, entre elas a instituição do Dia Estadual da Reforma Protestante . No terceiro lugar do ranking aparecem empatados Lucas Ramos (PSB); Bispo Ossésio (PRB), que se elegeu deputado federal; Simone Santana (PSB); Clodoaldo Magalhães (PSB) e Henrique Queiroz (PR) com 21 projetos.
Dois projetos de autoria de Lucas Ramos denominam espaços com o nome do ex-governador Eduardo Campos. O primeiro muda o nome da Barragem de Serro Azul, no município de Palmares, e outro dá o nome do ex-governador à quadra da Escola Estadual Ernesto de Souza Leite no Município de Tuparetama. É de autoria do ex-deputado Ossésio, por exemplo, o projeto que conferiu ao município de Abreu e Lima o título honorífico de capital dos evangélicos de Pernambuco.
Antônio Moraes do (PP) aparece em quarto no ranking com 20 projetos. Um deles institui o Dia Estadual do Blogueiro, em 7 de junho. Eleito para o sexto mandato consecutivo, o parlamentar apresentou oito projetos este ano. Um deles concede o título de cidadã pernambucana à médica Fátima de Albuquerque Melo Nunes, que atua como gestora do ambulatório do Hospital dos Servidores do Estado. Outro, cria o Dia Estadual do Cigano. Socorro Pimentel (PTB) e Augusto César (PRB) ficaram em quinto com 19 projetos. E Ze Mauricio (PP) em último lugar com 18.
Propostas de homenagens quase nunca enfrentam resistência para aprovação no Plenário, observa a cientista política Michelle Fernandez, que também é pesquisadora da Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia em Pernambuco. Isso acontece apenas quando suscitam polêmicas, explica. “Homenagens a figuras políticas como Marielle Franco ou Bolsonaro costumam despertar divergências em razão da polarização política atual”, argumenta.
“Com a pesquisa, queremos oferecer uma métrica de avaliação da atividade parlamentar para a população, que pode ter argumento para questionar a relevância dessas propostas”, explica Pedro Cunha, membro da Cidadão Fiscal, que se apresenta como uma organização que usa a tecnologia para fiscalizar os políticos de Pernambuco. Ele detalha que a ONG desenvolveu um robô para compilar e categorizar os projetos. “No final nossa equipe fez uma dupla checagem das informações e das categorias”.
Ainda na avaliação da cientista política Michelle Fernandez, o volume de projetos dedicados a homenagens, celebrações e/ou nomeações de espaços são indicativos de “uma baixa atividade do legislativo”. “Quando se prioriza essas questões em detrimento dos problemas reais da população, os parlamentares deixam de atuar de maneira mais significativa para a população”.
Mas a especialista salienta, contudo, que o simples fato de uma proposta ser enquadrada nessas categorias não significa necessariamente que a iniciativa seja sem importância. “Para se avaliar a qualidade da atividade legislativa é preciso uma análise mais aprofundada das propostas”, aponta. Por exemplo, a criação de datas como o Dia Estadual de Conscientização sobre a Doença de Lyme , a partir de um projeto da deputada Roberta Arraes, é justificável como instrumento para chamar atenção da sociedade em relação aos que sofrem com essa patologia.
Fazer a pesquisa dos projetos apresentados por deputados estaduais e ex-deputados estaduais sem o auxílio de um robô, ao contrário do que fez a ONG Cidadão Fiscal, é um trabalho complexo porque o site da Alepe não disponibiliza o histórico dos projetos apresentados em legislaturas anteriores. Apenas as propostas da legislatura atual, iniciada em janeiro deste ano, estão disponíveis para consulta pública. Ou seja, atualmente apenas seis meses de atividade legislativa podem ser consultados e analisados pelos eleitores.
A Assessoria de Imprensa da Casa Legislativa disse que a busca do site “sempre funcionou dessa forma”, sem registro histórico. Informou ainda que projetos não aprovados só podem ser acessados via solicitação formal à ouvidoria, via Lei de Acesso à Informação. É possível, contudo, pesquisar as propostas aprovadas, ou seja, aquelas que viraram lei. Elas ficam abertas para consulta pública no portal da legislação de Pernambuco – Alepe Legis, na aba pesquisa avançada, com o nome do parlamentar.
A base completa da pesquisa feita pela ONG Cidadão Fiscal está disponível para download aqui.
Respostas
A reportagem da Marco Zero Conteúdo procurou os deputados citados para questionar a justificativa das propostas e se concentrar energia em projetos como esses não desvia o foco de proposições que tragam impactos diretos para a sociedade? Não conseguimos contato com alguns gabinetes por conta do recesso parlamentar. Reproduzimos abaixo a resposta que recebemos até a publicação desta matéria. À medida que recebamos novas respostas de outros parlamentares, elas serão inseridas no texto.
Deputado Lucas Ramos – PSB (via Assessoria de Imprensa)
Propor denominação a equipamentos públicos é uma das prerrogativas dos parlamentares, que cumprem seu dever legislativo e prestam justas homenagens a personalidades que contribuíram com o desenvolvimento do Estado nos mais diversos campos. Além da preservação da memória dos homenageados, a identificação facilita o trâmite legal para a aplicação de recursos públicos futuros.
A Marco Zero também poderia concentrar esforços na valorização das diversas iniciativas legislativas que transformam a vida dos pernambucanos, como por exemplo o marco da atividade de Foodtruck, a divulgação de fotos de pessoas desaparecidas em jornais, revistas e periódicos para promover reencontros de famílias desesperadas sem notícias, os cardápios com fonte ampliada em bares e restaurantes proporcionando dignidade a pessoas de baixa visão, a garantia de quem precisa do apoio do cão-guia para viajar em táxis e ônibus sem constrangimento, e o estímulo do uso da bicicleta para melhorar a mobilidade urbana ao estabelecermos espaços para estacionamento em prédios públicos. Propostas que são de nossa autoria e permitem a melhoria da qualidade de vida de todos os pernambucanos. O direito à vida e o exercício da cidadania estão assegurados por ações do nosso gabinete. O importante trabalho da Marco Zero também pode ser homenageado por uma dessas prerrogativas do Poder Legislativo, a partir da iniciativa de qualquer deputado, e certamente não seria motivo algum de constrangimento para nenhuma das partes.Deputada Simone Santana -PSB (via Assessoria de Imprensa)
A deputada Simone Santana informa que todas as suas ações parlamentares, assim como de seu gabinete, são tomadas no sentido de exercer com integralidade os papéis designados a uma deputada estadual. Sendo assim, estando prevista em regimento interno, a oportunidade de homenagear e dar visibilidade a projetos, pessoas e entidades que contribuem com o desenvolvimento social em Pernambuco é apenas uma das diversas atribuições de seu mandato.
Vale ressaltar, também, que nenhum requerimento, indicação ou simples ofício é homologado pelo gabinete sem que o tema do documento seja pautado pelos pilares de atuação da deputada, como os direitos da primeira infância e das mulheres. As homenagens conferidas pelo gabinete, portanto, não fogem à exceção. Citamos, por exemplo, a criação do Dia Estadual de Combate ao Feminicídio, para que o tema ganhe mais visibilidade; a entrega da Medalha Leão do Norte a Dra Vera Moraes, criadora do GAC; e a realização anual de uma sessão solene em homenagem a mulheres empreendedoras de nosso Estado.
Contudo, como afirmamos anteriormente, a atuação da deputada Simone Santana não se resume às referidas homenagens. A parlamentar foi por quatro anos presidente da Comissão de Defesa dos Direitos das Mulheres da Alepe; criou a Comissão Itinerante da Mulher; a Ação Formativa Mulheres na Tribuna; criou e coordena a Frente Parlamentar pelos Direitos da Primeira Infância (que está elaborando um diagnóstico da situação da infância em Pernambuco e um observatório orçamentário voltado para as políticas públicas para a faixa-etária), além de atuar diretamente com os municípios pernambucanos, em articulação com o Governo do Estado, para garantir obras, serviços e políticas que impactam diretamente na vida da população, mas que muitas vezes não ganham a mesma notoriedade que uma homenagem.
Diante do ensejo, a deputada aproveita o espaço para sugerir ao Marco Zero Conteúdo maior aproximação com o Legislativo pernambucano, de modo a dar visibilidade às ações parlamentares e a ajudar a aproximar este Poder do povo pernambucano. Existe uma gama de projetos e Leis que depende de divulgação para que a sociedade se aproprie das mesmas, a exemplo da Lei Estadual nº 15878/2016, que permite aos usuários do transporte público metropolitano o embarque e desembarque dos coletivos em qualquer trecho do percurso entre 5h e 22h; o Decreto do Executivo nº44950 que incluiu o subtítulo Feminicídio nos Boletins de Ocorrência no Estado, viabilizado por meio de Indicação da Alepe; ou o recém aprovado Projeto de Lei nº 126/19 que garante a notificação compulsória por parte dos hospitais em casos de violência autoprovocada -, para citar apenas algumas medidas que se tornaram realidade a partir da atuação da deputada.
Por fim, para que os Projetos de Lei referentes a homenagens deixem de ser maioria, é preciso também dar visibilidade às propostas que entram em tramitação, mas sofrem severa pressão de setores da sociedade por seu arquivamento, a exemplo dos PLs 68/2019 e 200/2019, de autoria da deputada, que visam proibir a comercialização e distribuição de canudos plásticos descartáveis em Pernambuco e a comercialização e distribuição de recipientes plásticos descartáveis na orla do Estado, respectivamente.
Jornalista formada pela Universidade Católica de Pernambuco (Unicap) e pós-graduada pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Foi repórter de Economia do jornal Folha de Pernambuco e assinou matérias no The Intercept Brasil, na Agência Pública, em publicações da Editora Abril e em outros veículos. Contribuiu com o projeto de Fact-Checking "Truco nos Estados" durante as eleições de 2018. É pesquisadora Nordeste do Atlas da Notícia, uma iniciativa de mapeamento do jornalismo no Brasil. Tem curso de Jornalismo de Dados pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e de Mídias Digitais, na Kings (UK).