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Franklin Martins e Jean Wyllys debatem como o jornalismo pode resistir aos algoritmos

Raíssa Ebrahim / 08/10/2021

Crédito: Agência Brasil

“A resposta para a ultra segmentação dos algoritmos está na rua, na ágora”. É o que defende Franklin Martins, jornalista e ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social, entre 2007 e 2010, no governo do ex-presidente Lula. “Tem que ter tecnologia, mas tem que ter a embocadura da praça pública. A ultra segmentação é coisa para impedir que a política seja feita e decidida em praça pública. Temos que sair da bolha, falar com quem pensa diferente da gente”.

Figura central na resistência contra a ditadura militar, Franklin falou, nesta sexta-feira, 8 de outubro, sobre “jornalismo de resistência” durante o 44º Intercom – Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. Descartando a contratação de um “super marqueteiro”, como nas disputas anteriores, Lula convidou Franklin para coordenar a comunicação de sua pré-campanha a 2022. O jornalista, naturalmente, não quis falar sobre as estratégias que serão adotadas ao ser perguntado sobre o convite ao final da mesa no congresso.

Franklin dividiu o momento com o jornalista e ex-deputado federal Jean Wyllys e o juiz federal Edevaldo de Medeiros. A mediação foi de Felipe Pena, jornalista, psicólogo, roteirista e professor da Universidade Federal Fluminense (UFF). Paulo Freire e a comunicação como prática de liberdade, resistência e cidadania são os grandes temas deste ano do maior evento científico da área de comunicação da América Latina, que acontece na Universidade Católica de Pernambuco (Unicap), no Recife, até este sábado, 9 de outubro.

A mesa – sem participação de nenhuma mulher, diga-se de passagem -, frisou o tempo inteiro: resistência é a palavra-chave para entender o momento brasileiro. Como disse Pena, citando o guerrilheiro Che Guevara, lembrando dos exatos 54 anos de seu assassinato, em 8 de outubro de 1967, “A revolução vai começar depois que vencermos essa guerra”.

Franklin também falou sobre censura e pluralidade: “Não é só a censura um gravíssimo problema. Ela é intolerável, inadmissível, mas ela é um dos perigos que ameaçam a liberdade de imprensa e do resto da sociedade de se informar. O outro é a falta de pluralidade. Se houver monopólio, com agentes decidindo entre si o que pode ou não ser publicado, eles estão controlando uma área essencial, da circulação da informação e da organização do debate político”.

“Jornalismo e resistência são duas coisas muito ligadas, principalmente nas épocas mais sombrias da sociedade”, pontuou Franklin, que fez parte do movimento estudantil e começou a fazer jornalismo ainda na adolescência, na boca do golpe militar. “Minha geração cometeu vários erros, mas não cometeu o pior erro, que seria não lutar”, relembrou, ao frisar que a ideia de insubmissão foi essencial na construção da democracia e do jornalismo no Brasil.

Tão crítico quanto otimista, Franklin defendeu que “o jornalismo de manipulação esconde os grandes interesses da sociedade para fazer com que discursos que não têm consistência na sociedade possam dominar”. A fala dele cabe perfeitamente no atual momento em que narrativas valem mais do que verdades e também na análise da cobertura da Vaza Jato e, agora mais recentemente, do Pandora Papers. Nas palavras do jornalista, “a imprensa sentou em cima” dessas coberturas ao não repercuti-las como “gravidade monumental”.

O aquário das bigtechs

Partindo também da própria experiência de resistência individual, Jean Wyllys, que precisou renunciar ao mandato de deputado federal e hoje vive em Barcelona, na Espanha, disse que vem estudando modos de furar as bolhas e como ter comportamentos que não nos aprisionem às redes. “Com diversificação de conteúdo, perfis e produções que não possam ser escrutinadas pelos algoritmos”, cita.

Para ele, “as tecnologias não são em si problemáticas, nós humanos é que somos”. Sobre seu retorno ao Brasil, Jean adiantou: “Vamos criar um cinturão sanitário em torno da direita e, quando isso acontecer, eu vou voltar, eu vou querer voltar”.

Os debates do Intercom têm sido bastante permeados pela discussão em torno das bigtechs, das cinco gigantes Google, Apple, Facebook, Amazon e Microsoft (“Gafam”). Sobre isso, Jean também defende a ideia das plataformas como colonizadoras do espaço e redutora das relações, num certo sentido: “Tínhamos um oceano a nossa frente e as plataformas e seus algoritmos, a forma como programa operam, criaram em torno de nós um aquário”. Tudo isso, complementa, para servir a um modelo de negócios, um capitalismo de plataforma, e que teve impactos negativos sérios nos processos democráticos e decisórios, levando à ascensão da extrema-direita em diferentes partes do mundo.

Não por acaso, em 2022, ano de eleições, o tema central do Intercom será desinformação.

AUTOR
Foto Raíssa Ebrahim
Raíssa Ebrahim

Vencedora do Prêmio Cristina Tavares com a cobertura do vazamento do petróleo, é jornalista profissional há 12 anos, com foco nos temas de economia, direitos humanos e questões socioambientais. Formada pela UFPE, foi trainee no Estadão, repórter no Jornal do Commercio e editora do PorAqui (startup de jornalismo hiperlocal do Porto Digital). Também foi fellowship da Thomson Reuters Foundation e bolsista do Instituto ClimaInfo. Já colaborou com Agência Pública, Le Monde Diplomatique Brasil, Gênero e Número e Trovão Mídia (podcast). Vamos conversar? raissa.ebrahim@gmail.com