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Crédito: Luna Costa / Ministério da Igualdade Racial
No mês conhecido como Julho das Pretas, em alusão a história de mulheres negras que lutam contra o machismo e o sexismo, e marcado pelo Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, comemorado nesta terça-feira, 25 de julho, o Ministério da Igualdade Racial (MIR) lançou um programa de concessão de bolsas destinado a mulheres negras, quilombolas, indígenas e ciganas.
Intitulado “Atlânticas: Programa Beatriz Nascimento de Mulheres na Ciência”, a iniciativa é fruto da parceria entre o MIR, outros três ministérios (dos Povos Indígenas, da Ciência, Tecnologia e Inovação, das Mulheres, CNPq e CAPES. A soma de esforços possibilitará que o Governo Federal invista R$ 8 milhões em bolsas de doutorado sanduíche (com uma temporada de estudos realizada fora do país) e pós-doutorado no exterior. Os editais devem ser lançados até o final deste ano e a expectativa é de que sejam ofertadas 45 bolsas. Além disso, o programa prevê auxílios para a obtenção de passaporte e vistos.
“A nossa luta é todo dia. Ela é uma luta coletiva e essa luta perpassa, sem dúvida, pela educação. Eu acredito em uma educação mais digna, mais humana, mais diversa, não dispersa. E que cada vez mais a gente possa fortalecer, abrir portas”, afirmou a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, durante o evento de lançamento do programa Atlânticas, que aconteceu no dia 20 de julho, no auditório da Universidade Federal do Pará (UFPA).
De acordo com dados coletados pela área de Tecnologia da Informação do CNPq, e divulgados pelo MIR, das bolsas de doutorado sanduíche vigentes no país, as mulheres negras são 4,9% das bolsistas, enquanto as brancas são 30,9% e não há nenhuma indígena beneficiada. Já no pós-doutorado no exterior, as mulheres negras são 12,6% das bolsistas, as brancas 37,7% e também não há indígenas bolsistas.
Diante desse baixo número de mulheres negras e indígenas nos programas de pós-graduação, o Atlânticas surge para mudar o cenário promovendo o ingresso dessas mulheres nas universidades. “Esperamos que o Atlânticas incentive cada vez mais mulheres a buscarem a carreira científica, especialmente aquelas que foram historicamente excluídas desses espaços”, defendeu a diretora de Ações Afirmativas do Ministério da Igualdade Racial, Anna Venturini.
Jovem negra e nordestina, nascida em Aracaju, Beatriz Nascimento viveu boa parte de sua vida no subúrbio carioca e iniciou sua vida acadêmica em 1968 ao ingressar no curso de história na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Profundamente marcada e influenciada pelas movimentações políticas e culturais de sua época, com o nascimento do Movimento Negro Unificado (MNU), Beatriz Nascimento dedicou seu trabalho à história do povo negro no Brasil longe do olhar colonizador, que estava mais interessado em colocar o negro em um lugar de subalternidade escravizada do que como protagonista de uma trajetória de luta e resistência, com um aporte cultural africano.
A historiadora reconhecia e defendia o poder das nações que nasceram da “transmigração”, do processo escravocrata que tirou o povo africano de suas terras e através do Atlântico os trouxeram para a América, onde criaram uma nova forma de vida.
Um dos seus estudos mais notáveis diz respeito a repensar as favelas do Brasil como uma nova configuração dos quilombos que existiram na época da escravidão, defendendo o poder organizativo do povo negro que sempre encontrou na coletividade uma forma de manter viva sua cultura e história. A vida curta da historiadora não impediu que seu legado fosse repassado para as outras gerações. Beatriz Nascimento foi assassinada a tiros em janeiro de 1995, aos 35 anos, pelo namorado de uma amiga, que era acusado de agressão e estava em regime semiaberto respondendo por homicídio.
Em uma de suas falas mais emblemáticas, que foi perpetuada em livros e música, a historiadora enfatiza a necessidade do protagonismo dos negros e indígenas na formação acadêmica do país ao afirmar que: “A história do Brasil foi escrita por mãos brancas. Tanto o negro, quanto índio não têm sua história escrita, ainda. Isso é um problema muito sério porque a gente frequenta universidade, frequenta escola e não temos uma visão correta do passado do negro”.
Presente no evento de lançamento do programa “Atlânticas: Programa Beatriz Nascimento de Mulheres na Ciência”, Luena Nascimento, antropóloga e sobrinha de Beatriz Nascimento, defendeu a importância da iniciativa para a diminuição da violência contra as mulheres negras. “As balas que mataram a minha tia e a Marielle são da mesma ordem da violência, da misoginia, do patriarcado que também nos silenciou, que colocou nós mulheres em lugares subalternos e muitas vezes tem sido um espaço de silenciamento, interrupção, desencorajamento. É um espaço de perplexidade e surpresa quando os nossos trabalhos, nossas pesquisas, nossas trajetórias, encontram reconhecimento vindo de outros lugares”, disse Luena.
Também em homenagem ao Julho das Pretas, o Núcleo de Diversidade e Inclusão (NDI) da Fiocruz Pernambuco, em parceria com a unidade da Bahia, lançou a campanha “Mulheres Negras na Ciência”. A iniciativa tem o objetivo de incentivar o ingresso de mulheres negras na ciência por meio da divulgação da trajetória de cientistas influentes e, para isso, ao longo do mês de julho, estão sendo realizadas postagens no site e no Instagram da instituição com o perfil dessas mulheres.
Entre as cientistas homenageadas estão: Danielle Maria Nascimento, biomédica e doutora em Genética com ênfase em Biologia Molecular atuante no departamento de Imunologia da Friocruz PE; Jurema Werneck, médica, doutora em Comunicação e Cultura e diretora-executiva da Anistia Internacional Brasil; e Vera Baroni, advogada especialista em Saúde Pública e Direitos Humanos e fundadora da Uiala Mukaji – Sociedade das Mulheres Negras de Pernambuco.
Esta reportagem foi produzida com apoio do Report for the World, uma iniciativa do The GroundTruth Project.
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