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Mulheres vão às ruas para mover estruturas do Estado

Débora Britto / 09/03/2020

Crédito: Débora Britto/MZ Conteúdo

No lugar de flores e chocolates, cartazes e bandeiras denunciam as violências que o Estado brasileiro pratica contra as mulheres. No Recife, a mobilização histórica das mulheres que acontece no 8 de março, este ano está diferente.

A opção por realizar um grande ato na segunda-feira, dia seguinte ao 8 de março, é o desejo de anunciar para a sociedade, em dia útil, que as mulheres nunca estiveram caladas e não serão silenciadas, apesar de todo esforço do governo de Jair Bolsonaro. A presença das mulheres nas ruas se dá sob o tema Feministas contra a violência do Estado racista, patriarcal e capitalista.

O tema da marcha em 2020 volta a denunciar a estrutura da sociedade e do Estado brasileiro lembrando que o momento de avanço do conservadorismo também é oportuno para reorganizar lutas e fortalecer a diversidade das mulheres. São mulheres negras, pobres, rurais, urbanas, indígenas, lésbicas, bissexuais, trans, gordas, jovens, velhas, portadoras de deficiência, aprisionadas e tantas outras. Todas estão na mira e sendo atingidas, desde sempre, por ataques que, agora, se tornaram mais letais para as mulheres.

Mover as estruturas

Crédito: Débora Britto/MZ Conteúdo

Há 20 anos fora do Brasil, a socióloga Betânia Ramos Schröder aproveitou a estadia em Recife para ir às ruas e elogiou o tema da marcha: “É uma grandeza”. Segundo ela, ao focar no Estado, a marcha chama a atenção para questionamentos fundamentais: “Quem são os agentes políticos do nosso Estado? Quem está tomando as decisões? Quem ocupa os cargos do funcionalismo do Estado? A maioria dessas pessoas tem perfil oligárquico dessa história que perpassa e estrutura o país. Precisamos mover essa estrutura”.

Betânia argumenta que as mudanças não devem se dar apenas na política, mas também na estrutura, pois “ela ainda não nos contempla”. Ela defende que participar dos eventos do 8 de Março, é crucial: “Se a gente não cria participação na política, não cria participação no funcionalismo público, sempre na perspectiva de nossas representações, não vamos ter serviço público, de educação e de saúde que corresponda às nossas necessidades históricas de superação das desigualdades”.

Betânia Schröder diz que é preciso mover as estruturas do Estado. Crédito: Débora Britto/MZ Conteúdo

Trabalhadoras contra o desgoverno

Maria Isabel Nunes, professora aposentada e diretora do Sindicato de Professores da Rede Municipal de Olinda (Sinpol), analisa que o contexto pede um mudança de postura da classe trabalhadora, a partir da sua profissão:

“Nós que trabalhamos na escola pública, trabalhamos com a periferia, com trabalhadores informais, com mulheres que precisaram abrir mão de estudar. A mulher hoje está na educação por paixão, mas não pode esquecer que é uma trabalhadora e que precisa ter seus direitos garantidos”.

O congelamento por 20 anos de gastos com educação acendeu o alerta ainda no governo Temer, mas vem se agravando com Bolsonaro. Para ela, o momento pede cada vez mais ruas ocupadas em defesa de direitos. “Esse governo está dando muitas rasteiras no trabalhador, se a gente não vier para a rua a gente vai continuar perdendo”, conta.

Para Maria Isabel, circunstâncias exigem nova postura. Crédito: Débora Britto/MZ Conteúdo

A carta política

O conteúdo do manifesto elaborado pelas mulheres para nortear a Marcha também foi além das tradicionais bandeiras feministas. A “carta política”, distribuída às vésperas e durante o ato, sai em defesa da juventude negra, da população carcerária, dos povos indígenas, dos trabalhadores e trabalhadoras.

No entanto, o texto também guarda espaço para o otimismo, celebrando o engajamento de novos rostos e vozes: “O feminismo está colocado no cotidiano da sociedade brasileira, com o aumento da adesão especialmente entre as jovens mulheres. A pluralidade dos sujeitos políticos e dos formatos organizativos é uma riqueza deste movimento, que se mantém democrático, criativo e ousado”.

Crédito: Débora Britto/MZ Conteúdo

AUTOR
Foto Débora Britto
Débora Britto

Mulher negra e jornalista antirracista. Formada pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), também tem formação em Direitos Humanos pelo Instituto de Direitos Humanos da Catalunha. Trabalhou no Centro de Cultura Luiz Freire - ONG de defesa dos direitos humanos - e é integrante do Terral Coletivo de Comunicação Popular, grupo que atua na formação de comunicadoras/es populares e na defesa do Direito à Comunicação.