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Pesquisa da Rede de Observatórios da Segurança identificou 92 casos em 2023
Crédito: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil
Em 2023, 92 mulheres foram vítimas de feminicídio em Pernambuco, segundo o novo relatório Elas Vivem: liberdade de ser e viver, da Rede de Observatórios da Segurança. No Nordeste, o estado ocupa o primeiro lugar no número de casos de feminicídio entre os estados monitorados pela Rede para o boletim. Ao todo, são oito: Bahia, Ceará, Maranhão, Pernambuco, Piauí, Pará, Rio de Janeiro e São Paulo. O resultado do ano passado é 55,9% maior que o de 2022, quando 59 mulheres perderam a vida pelo fato de serem mulheres em Pernambuco.
Os dados detalhados nesta matéria foram divulgados nesta quinta-feira, 7 de março, véspera do Dia Internacional das Mulheres, quando acontece, em todo o Brasil, a marcha anual 8M. No Recife, ato terá concentração às 15h e saída às 17h do Parque Treze de Maio, no Centro da cidade. O tema deste ano é “Pela vida das mulheres: pela legalização do aborto. Contra o racismo ambiental e as violências. Não às privatizações”.
Dos 92 casos, 62 foram cometidos por parceiros ou ex-parceiros. Recife foi a cidade que liderou na quantidade de feminicídios, com 10 registros. O estado também teve o maior número de vítimas mortas com armas de fogo na região: 28 casos. O número de transfeminicídios caiu de um ano para o outro em Pernambuco. Foram cinco casos em 2023 contra 12 em 2022, uma redução de 58,3%.
O número total de eventos de violência contra elas também aumentou de um ano para o outro em Pernambuco. Passou de 225, em 2022, para 319, em 2023 — um crescimento de 41,8%. A maioria desses casos foi cometida por companheiros e ex-companheiros, motivados pela não aceitação do término do relacionamento, seguida de ciúmes, sentimento de posse e machismo. Entre os municípios, Garanhuns ficou na liderança dos registros de violência (44), seguido de Recife (40).
Clique aqui para ter acesso ao relatório na íntegra.
“Porém, não podemos deixar de responsabilizar o Estado também”, alerta, no relatório, Dália Celeste, pesquisadora afrotransfeminista com foco nos temas gênero, raça, etnia e sexualidade, também estudante de psicologia.
Dália acredita que o aumento de casos “mostra a tolerância do governo em permitir tantas mortes de mulheres, evidenciando a falta de políticas públicas e a desigualdade na sua distribuição regional para evitar que esses crimes aconteçam”, como escreveu no boletim. E argumentou mais: “A política de segurança pública e defesa social de Pernambuco ‘Juntos pela Segurança’ promete inserir os indicadores de violência contra mulher no centro do debate. Contudo, a demora na apresentação dessa política já comprometeu os indicadores do ano passado e mais mulheres foram vitimadas”.
À Marco Zero, ela disse perceber que “existe uma ausência nas políticas de segurança e proteção à mulher nas cidades do interior”, pois “o pouco de recursos que temos é bastante focado na Região Metropolitana do Recife, o que deixa as mulheres das cidades vizinhas ainda mais vulneráveis. Percebo muito que essa dinâmica tem sido uma grande influência na violência. Essas mulheres seguem um certo abandono do Estado, nas cidades vizinhas não temos e nem vemos redes de proteção”, detalha.
Nos oito Estados monitorados pela Rede de Observatórios da Segurança, ao menos oito mulheres foram vítimas de violência a cada 24 horas. A cada 15 horas, ao menos uma mulher foi vítima de feminicídio.“A quarta edição do relatório Elas Vivem comprova que, no Brasil dos direitos humanos e da Lei Maria da Penha, ainda é difícil ser mulher. Ameaças, agressões, torturas, ofensas, assédio, feminicídio. São inúmeras as violências sofridas que não começam ou se esgotam nas mortes registradas”, traz o documento.
Os dados monitorados registraram, ao todo, 3.181 eventos de violência em 2023, um aumento de 22% em relação a 2022. Desses casos, 586 foram feminicídios e 34 foram transfeminicídios. Do total de feminicídios, 72,7% foram cometidos por companheiros e ex-companheiros. Pelo quarto ano consecutivo, há escassos registros de raça/cor das vítimas, aponta a Rede, já que 71,7% das vítimas não tiveram informação racial nos registros oficiais.
A Rede reforça que “não existe combate à violência sem pesquisa e investigação. As políticas públicas são capazes de evitar violências e preservar vidas. Muitas mulheres vitimadas poderiam ter sido salvas, assim como os ciclos de violência interrompidos, se houvesse uma intervenção efetiva de um Estado que insiste em negligenciar os dados e dificultar o caminho das vítimas”.
“São as memórias que sustentam o grito entalado de indignação e a cobrança por justiça. A mobilização contra o feminicídio e outras formas de violência salva vidas. Nós já perdemos mulheres demais, e ainda perderemos. É a denúncia incansável que preservará a vida de tantas outras”, comenta a jornalista Isabela Reis, que assina o principal texto desta edição do relatório.
Vencedora do Prêmio Cristina Tavares com a cobertura do vazamento do petróleo, é jornalista profissional há 12 anos, com foco nos temas de economia, direitos humanos e questões socioambientais. Formada pela UFPE, foi trainee no Estadão, repórter no Jornal do Commercio e editora do PorAqui (startup de jornalismo hiperlocal do Porto Digital). Também foi fellowship da Thomson Reuters Foundation e bolsista do Instituto ClimaInfo. Já colaborou com Agência Pública, Le Monde Diplomatique Brasil, Gênero e Número e Trovão Mídia (podcast). Vamos conversar? raissa.ebrahim@gmail.com