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Três obsessões perseguem os estudantes que ocupam, desde o dia 31 de outubro, quatro prédios da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE): segurança, limpeza e organização. Escaldados com o destino do movimento estudantil em outras mobilizações célebres, como as ocupações das reitorias da USP e UnB, os alunos da Rural estão tomando todos os cuidados para, no futuro, não serem acusados pela polícia ou pela administração de destruir equipamentos ou instalações físicas.
Na entrada de cada unidade ocupada, um grupo de estudantes garante que nenhuma pessoa estranha à universidade entre sem estar devidamente acompanhado de outra aluno ou de algum professor. Em nome da Marco Zero Conteúdo, este repórter visitou o Centro de Ensino de Graduação, localizado na área central do campus e só entrou após ter sido apresentado pelo estudante de Medicina Veterinária, Manoel Aleixo.
Divididos em equipes, os estudantes Centro de Ensino de Graduação recolhem lixo de manhã e no final da tarde. Os banheiros são lavados diariamente. O prédio está muito limpo, a varrição é impecável. A equipe da cozinha mantém a cantina organizada e funcionando praticamente durante o dia todo para garantir as três refeições. Bebida alcoólica, nem pensar – austeridade capaz de arregalar os olhos dos militantes de outras décadas. O violão está liberado, que ninguém é de ferro.
Integrante do grupo de organização estudantil, Diogo “Maradona” explicou que outra preocupação é não deixar ninguém com a cabeça parada.
– Esta também é uma oportunidade para refletir, para fazer pensar. Por isso mantemos uma programação de aulas, oficinas, cursos, palestras, exibição de filmes – afirmou “Maradona”. A poucos metros, um cartaz pintado em tinta preta adverte: “Ocupação não é férias”.
A agenda é cheia. Para garantir a exibição dos filmes, os estudantes reabriram o auditório do Centro, fechado há quatro anos. O lugar passou por uma faxina profunda para exibir Martírio, filme sobre a luta dos Guarani-Kaiowá pelas suas terras, premiado na Janela Internacional de Cinema do Recife. Esta semana, será a vez de Aquarius, devidamente autorizado pelo diretor Kléber Mendonça Filho.
Enquanto os detalhes da programação eram acertados, uma roda de conversa acontecia no hall do térreo, bem em frente à porta do tal auditório. Era, na verdade, uma reunião ordinária da equipe de bolsistas de um projeto acadêmico do Programa de Educação Tutorial, definindo as atividades do projeto que deverão acontecer nos próximos dias.
Mas, se a greve dos estudantes, técnicos e professores da Rural foi decretada desde 31 de outubro, o que faziam os bolsistas ali, numa reunião em plena ocupação? Seriam fura-greve?
O professor de Letras Júlio Vila Nova, responsável pelo projeto, responde:
– Nosso projeto consiste em realizar oficinas de Leitura e reforço em escolas públicas de Ensino Médio da cidade. Decidimos que vamos manter nossas atividades, porém iremos levar nossas oficinas com os alunos de graduação para as escolas estaduais ocupadas. Vamos começar pela Escola Professor Cândido Duarte, em Apipucos.
Codinomes
No caminho entre a faculdade de Veterinária, onde participei de uma palestra sobre jornalismo independente, e o Centro ocupado, o estudante Manoel Aleixo explicou que os estudantes que estão à frente do processo estão usando apelidos ou codinomes. Uma das lideranças é chamada de “Dilma”. Lógico que nosso cicerone “Maradona” é Diogo, mas não é “Maradona” (bem que poderia ser, tem estilo).
Inicialmente, julguei que, preocupados com a segurança ou com represálias do MEC de Mendonça Filho tinham adotado uma medida ingênua à moda da clandestinidade dos anos 60 e 70. A ingenuidade, no caso, é do repórter que vos escreve.
Na verdade, trata-se de um antídoto contra a vaidade, o estrelismo e a tentação de usar o movimento para se lançar na carreira política, afinal o movimento obedece à lógica e à dinâmica do Ocupe pelo mundo afora: é um movimento sem lideranças e que se recusa a ser aparelhado ou conduzido pelas bases dos partidos de esquerda nas universidades.
Jornalista e escritor. É o diretor de Conteúdo da MZ.