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Vereadores do Recife aprovam uso medicinal da cannabis na rede municipal de saúde

Giovanna Carneiro / 29/10/2024
A imagem mostra uma sessão em um plenário, onde várias pessoas estão sentadas em uma mesa longa de madeira clara. Uma mulher, Cida Pedrosa, está em pé, falando ao microfone, enquanto outras estão sentadas, algumas olhando para papéis ou dispositivos eletrônicos. Cida Pedrosa tem cabelos ruivos, óculos de armação redonda, vestido escuro estampado com grafismos laranjas e amarelos, além de um colar laranja e amarelo que dá três voltas em seu pescoço. No fundo, há um grande painel eletrônico com nomes e números, possivelmente indicando votos ou presença de membros. A sala tem um design moderno, com paredes de madeira clara e iluminação suave.

Crédito: Roberto Jaffier

A Câmara de Vereadores do Recife aprovou, nesta terça-feira, 29 de outubro, por unanimidade, o projeto de lei que garante a distribuição de medicamentos derivados da cannabis medicinal e cria a Política Municipal de Uso e Distribuição de Remédios Derivados da Cannabis sp. A aprovação estabelece base legal para que pacientes possam ter acesso as medicações e autoriza a distribuição gratuita das mesmas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no Recife.

A proposta regulamenta o uso terapêutico da maconha para tratar pacientes de diversas condições como epilepsia refratária, esclerose múltipla, dores crônicas e outras patologias. Para tal, regulamenta a produção de óleos, extratos, tinturas, pomadas, cápsulas, supositórios, comprimidos e inalantes derivados da cannabis sp.

A proposta foi aceita por todos os vereadores e vereadoras da Câmara, até mesmo os integrantes da bancada evangélica.

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Cannabis sp. corresponde às diversas variedades da planta Cannabis Sativa, da família botânica Cannabaceae, fêmea, com todas as suas partes, inclusive a semente, que podem ser pesquisadas e utilizadas para a produção de derivados terapêuticos destinados ao tratamento de determinadas patologias;

 “Quando eu cheguei aqui [Câmara] e quando eu falava sobre um projeto de lei desse, existia um preconceito muito grande. Eu lembro que quando eu discursei a primeira vez na Câmara e levei meu óleo, porque eu sou usuária do óleo para tratar dores crônicas, e apresentei na tribuna, assim que eu desci, um vereador disse assim, ‘vereadora, dá barato?’ E eu respondi ‘não, dá saúde’, tamanho era o preconceito. Mas nós fomos conversando e hoje nós conseguimos aprovar por unanimidade, inclusive a bancada evangélica votou favorável por ter chegado à conclusão de que não podemos negar a crianças, principalmente crianças atípicas, medicamentos que melhoram profundamente a qualidade de vida delas”, declarou a vereadora Cida Pedrosa (PCdoB), coautora do PL.

O texto aprovado apresenta diversas diretrizes para ampliar as possibilidades de uso e tratamento da cannabis medicinal. A partir de agora, será possível assegurar a produção e a disseminação de conhecimento científico sobre o assunto; promover a formação dos profissionais de saúde do município; acolher, diagnosticar e tratar pacientes cujo tratamento com a cannabis possua eficácia; promover políticas públicas de informação sobre a cannabis terapêutica, além de Incentivar a atuação de entidades de cannabis terapêutica no Recife.

O projeto prevê ainda a inclusão dos medicamentos a base de cannabis sp. na Relação Municipal de Medicamentos Essenciais (Remume) fornecidos pelo SUS e a redução no valor dos custos de medicamentos derivados da maconha. A proposta estabelece que os remédios distribuídos devem ser constituídos de derivado vegetal da planta.

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Derivado vegetal: produto da extração da planta medicinal in natura ou em estado vegetal, que contenha as substâncias responsáveis pela ação terapêutica, podendo ocorrer na forma de extrato; óleo fixo e volátil; cerai; exsudato; e outros.

Os medicamentos distribuídos deverão seguir ainda as regulamentações da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e, em caso de importação, estar em conformidade com as normas sanitárias. Todos os produtos precisarão apresentar certificados de análise especificando os teores de canabidiol e tetrahidrocanabinol.

“As pessoas pobres que utilizam o óleo conseguem que ele seja pago de forma judicial porque não existe essa oferta de forma democrática. Quando se aprova um projeto desse, a gente tem a possibilidade de ter na farmácia do munícipio o óleo de cannabis que será ofertado a partir da prescrição médica. Outra coisa importante é que agora nós teremos médicos do SUS que terão que estudar sobre essa medicação, porque hoje esse conhecimento ainda é muito restrito”, reforçou Cida Pedrosa.

O Projeto de Lei nº 207/2022 foi protocolado pela vereadora Cida Pedrosa (PCdoB), mas possui a coatouria de outros 25 vereadores: Alcides Cardoso (PL), Alcides Teixeira Neto (Avante), Aline Mariano (PSB), Almir Fernando (PSB), Chico Kiko (PSB), Dani Portela (PSOL), Dilson Batista (Avante), Doduel Varela (PSD), Eriberto Rafael (PSB), Fabiano Ferraz (MDB), Hélio Guabiraba (PSB), Ivan Moraes (PSOL), Jairo Britto (PT), Liana Cirne (PT), Marco Aurélio Filho (PV), Marcos di Bria Júnior (PSB), Natália de Menudo (PSB), Osmar Ricardo (PT), Paulo Muniz (PL), Prof. Mirinho (MDB), Rinaldo Júnior (PSB), Romerinho Jatobá (PSB), Samuel Salazar (MDB), Tadeu Calheiros (MDB) e Zé Neto (PSB).

Apesar de só ter sido aprovada agora, a proposta foi apresentada em 2022. A justificativa do projeto destaca a necessidade de oferecer alternativas terapêuticas com o uso da cannabis em tratamentos que já demonstraram eficácia em estudos científicos.

“Esse projeto antes de mais nada tem um caráter histórico porque foi aprovado por unanimidade. É que não é nem de direita, nem de esquerda, nem de centro, nem de nada, é um projeto de saúde. Nesse momento ele autoriza a prefeitura a realizar esse processo de garantir que esses medicamentos cheguem na rede do SUS. […] Ele permite que a prefeitura organize uma política que incentive a pesquisa sobre esse tema, e garante as bases para que a população que precisa, que pode ter acesso, ou que deveria ter acesso a esses medicamentos, possa, de fato, ter”, afirmou o vereador Ivan Moraes (PSOL), coautor da proposta.

“Mas, naturalmente, precisa ainda de luta e precisa de uma ação positiva por parte da prefeitura.[…] Esse é um projeto que demorou muito tramitando, foram dois anos de diálogos dentro da Câmara. O que atrasou, no meu entender, foi mais aquela negociação que se dá com a maioria. No caso, a base do governo. Como é um projeto que demanda da prefeitura, foi muita conversa, foi muito acordo, foi muita construção para que a prefeitura liberasse sua base para votar a favor”, explicou Ivan Moraes, lembrando que, para virar lei, o projeto precisa ser sancionado pelo prefeito João Campos.

AUTOR
Foto Giovanna Carneiro
Giovanna Carneiro

Jornalista e mestra em Comunicação pela Universidade Federal de Pernambuco.