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Com um ano e meio de atraso, o skatepark do Parque Santana já pode ser inaugurado

Maria Carolina Santos / 23/01/2020

Skatepark do Parque Santana. Foto: MCS/MZC

Finalmente, está prestes a sair: o polêmico skatepark do Parque Santana deve ser inaugurado até o próximo mês. A Secretaria de Turismo e Lazer do Governo do Estado disse que a pista está pronta – isso há mais de um mês, em dezembro. E que só falta a iluminação. O que se vê no skatepark, porém, são trabalhadores já remendando buracos no concreto da pista e fazendo acabamentos. O projeto também não foi realizado completamente: um canteiro de plantas não está pronto, assim como uma parte do terreno que chegou a ser escavado, mas acabou ficando fora da obra.

O skatepark foi controverso do início ao fim. É uma obra que, se realmente inaugurada nos próximos dias, custou mais de R$ 565 mil aos cofres públicos, terá sua entrega atrasada em um ano e meio, e foi construída sem que se ouvisse os frequentadores antes de ser projetada e orçada. Para muitos, era totalmente desnecessária. Isso porque já existia uma pista de skate construída há apenas seis anos no mesmo lugar – a única pista de skate surf da capital.

Mesmo com tantos outros parques no Recife sem aparelhos do tipo, a prefeitura do Recife e o Governo do Estado fizeram uma parceria para, com recursos do governo federal, via Ministério do Turismo, destruir uma pista de skate de uma modalidade, e colocar uma outra no lugar.

Há mais de um ano a Marco Zero Conteúdo publicou a reportagem “Férias sem diálogo e sem skate no Parque Santana” e a desculpa para o atraso na entrega permanece a mesma: a de que “uma antiga estrutura de concreto que, ao contrário do que foi previsto originalmente, não pode ser aproveitada”. É o que informa as notas da Secretaria de Turismo e Lazer de Pernambuco em dezembro de 2018 e em dezembro de 2019. Esta informação, porém, só foi divulgada depois dos atrasos da entrega da obra – e não depois da demolição.

O primeiro alerta sobre a pista ocorreu quando o projeto chegou pronto para os frequentadores. Pegos de surpresa, muitos não concordaram com os planos para o parque. No dia seguinte, retroescavadeiras já demoliam o concreto da pista, que, até aquele momento, funcionava normalmente. A expectativa, então, era de que a nova pista, com mais obstáculos, fosse construída em cinco meses. Era então maio de 2018.

Um grupo de frequentadores do parque foi formado naquela época, para acompanhar e fiscalizar as obras. Um dos integrantes fazia até voos de drone. Muitas foram as denúncias durante o período: não havia trabalhadores suficientes, a obra era cara demais, o concreto inadequado. Por semanas não se via trabalhadores no local, tanto que a pista ainda inacabada chegou a virar uma “piscina” no inverno passado.

A Marco Zero esteve no local três vezes nos últimos 30 dias. Nas duas primeiras, não havia ninguém trabalhando na obra, em horário comercial. Adolescentes eram os poucos frequentadores e não faziam críticas à pista.

Na terceira visita, há 10 dias, dois trabalhadores realizavam remendos em várias partes do concreto da pista. Representando o grupo dos frequentadores e apoiadores da antiga pista de surf skate, Alexandre Rocha creditou o reparo a uma pequena matéria de denúncia veiculada dias antes em um jornal local.

Alexandre apontou várias irregularidades na obra. As principais são na qualidade do concreto. Onde há pontas, ele já se solta com o impacto. Nas transições, há rachaduras. As exceções são os obstáculos feitos pela empresa de Anderson Mota “Trow”, conhecido desenvolvedor de pistas de skate no Recife. Graças a pressão dos frequentadores, ele foi contratado pela construtora USA para construir rampas no skatepark um dia antes de audiência pública sobre a obra na Câmara de Vereadores do Recife, em junho do ano passado.

Na audiência, que não teve participação de representante da USA, o atraso da obra também foi justificado pela demora no repasse do valor pelo hoje extinto Ministério dos Esportes. A construtora chegou a ser notificada duas vezes pelo Governo do Estado para retomar as obras. Na época, a expectativa era de que a pista ficasse pronta até o dia 30 de julho do ano passado.

“A princípio a nova pista dá muito mais condições de se fazer manobras do que a pista que tinha aqui antes. Mas a que a gente tinha aqui antes era a única do tipo surf no Nordeste”, argumenta Alexandre Rocha. “O piso, que se chama flat, e as rampas sem tanta tecnologia foram a empresa USA quem fez, que nunca construiu pista antes. A diferença para os obstáculos construídos por Anderson é grande. Os caixotes feitos pela empresa são tão mal feitos que já estão se desfazendo. Os que Anderson fez, estão ótimos, mas a emenda entre uma parte e outra é péssima. O cimento que eles usaram não foi o adequado. Para quem anda de skate, essas conexões são importantes, porque pode travar a roda e a pessoa se estatelar no chão”, detalha.

Parte do concreto já precisa de reparos. Foto: MCS/MZC

Alexandre Rocha critica finalização da obra. Foto: MCS/MZC

Quanto custou a obra?

Em 2017, a Secretaria de Esportes e Lazer recebeu um repasse de R$ 594.417,90 do Ministério dos Esportes para ser utilizado em equipamentos de esportes, via emenda do deputado federal Augusto Coutinho (SD). O projeto do desenho da pista foi feito pelo governo estadual. Em janeiro de 2018, a secretaria abriu licitação no valor de R$ 523.855,13 para contratar uma empresa para executar a obra, pelo menor preço. O dinheiro que sobrasse seria devolvido ao governo federal.

Mesmo sem experiência na construção de pistas do tipo, a USA Construção e Incorporação ganhou a licitação, com a proposta de R$ 474.832,56. Dois termos aditivos estão registrados no contrato inicial, de acordo com informações do Portal da Transparência. Nenhum deles inclui valores adicionais – um é troca de gestor do projeto na secretaria, o outro, prorrogação do prazo.

Um terceiro termo aditivo, esse com valor de cerca de R$ 100 mil, como falado na audiência pública na Câmara, foi firmado entre a a Secretaria e a Construtora. Ele ainda não consta no Portal da Transparência.

Em nota em dezembro de 2018, a secretaria afirmava que “o valor total do contrato de repasse do Ministério do Esporte para execução dos serviços é de R$ 594.417,90”, valor muito acima justamente por conta daquela parte de concreto que não foi reaproveitada e teve que ser demolida.

Agora, a secretaria informou que o valor total foi quase R$ 30 mil mais baixo que o divulgado um ano antes: R$ 565.728,34.

Além do contrato para a construção do skatepark, a USA Construção e Incorporação possui um contrato vigente de mais de R$ 1,7 milhão com a Secretaria de Educação do Estado para construção de quadras esportivas. Em 2018, também recebeu quase R$ 28 mil por um serviço de poda de árvores no Hospital dos Servidores do Estado.

A USA Construção e Incorporação já recebeu a maior parte do valor da construção do skatepark. De acordo com levantamento da Marco Zero Conteúdo, feito no Portal da Transparência, a empresa recebeu mais de R$ 510 mil pela obra, que ainda não foi inaugurada e já passa por reparos. A Marco Zero entrou em contato com Albérico Rêgo Barros, proprietário da construtora, que se limitou a dizer que a obra estava pronta e que não ia se pronunciar sobre ela.

AUTOR
Foto Maria Carolina Santos
Maria Carolina Santos

Jornalista pela UFPE. Fez carreira no Diario de Pernambuco, onde foi de estagiária a editora do site, com passagem pelo caderno de cultura. Contribuiu para veículos como Correio Braziliense, O Globo e Revista Continente. Ávida leitora de romances, gosta de escrever sobre tecnologia, política e cultura. Contato: carolsantos@gmail.com