Apoie o jornalismo independente de Pernambuco

Ajude a MZ com um PIX de qualquer valor para a MZ: chave CNPJ 28.660.021/0001-52

Depois da violência da PM, preparação do 19J em Recife é marcada por cuidados e expectativa

Raíssa Ebrahim / 16/06/2021
29M Recife

Crédito: Arnaldo Sete

No próximo sábado, 19 de junho, movimentos populares, centrais sindicais e partidos políticos de esquerda irão ocupar as ruas em mais um ato contra o governo federal. O 19J pede a saída do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), “vacina no braço e comida no prato”. Depois da violência por parte da Polícia Militar de Pernambuco (PMPE) que marcou o fim do 29M na capital pernambucana, as atenções estão voltadas para a atuação da corporação e também como será a resposta do Governo de Pernambuco a possíveis ações violentas e arbitrárias por parte da polícia.

A expectativa é que, em todo o país, as manifestações aconteçam em cerca de 500 cidades e reúnam ainda mais gente do que as do dia 29 de maio, o 29M, que mobilizou mais de 420 mil pessoas em aproximadamente 200 localidades, segundo os organizadores. 

No Recife, a concentração será novamente na Praça do Derby, área central, às 9h. O roteiro é o mesmo: após a concentração rápida, para não gerar aglomerações, os manifestantes seguirão pela Av. Conde da Boa Vista até a Av. Guararapes. Haverá de novo distribuição de máscaras pff2 e álcool. Os participantes serão organizados em filas para seguirem o trajeto com distanciamento. Haverá três grandes filas: Fora Genocida, Comida no Prato e Vacina no Braço. 

A organização pede que quem é grupo de risco ou more com pessoas dos grupos de risco não compareça ao 19J. Também não devem ir pessoas com sintomas da covid-19. Outra indicação é que cada um leve sua garrafa de água, se afaste na hora de abaixar a máscara para beber e se higienize e higienize pertences pessoas, como celular, assim que chegar em casa, além de colocar as roupas para lavar.

A expectativa é que a manifestação do dia 19 aconteça de forma pacífica, com início, meio e fim, sem nenhum tipo de ação desproporcional, com a polícia participando fazendo o seu papel de controle da segurança pública, dando garantia para que cidadãos possam ter seu direito de se manifestar. No ato passado, que seguia pacífico e respeitando as regras sanitárias desde o início do roteiro, manifestantes foram feridos por bala de borracha, duas pessoas perderam o olho após serem atingidas à queima-roupa e a vereadora Liana Cirne (PT) foi agredida com spray de pimenta.

Constrangimento internacional

O professor, coordenador da Cátedra Unesco/Unicap de Direitos Humanos Dom Hélder Câmara e presidente do Centro Dom Hélder Câmara de Estudos e Ação Social (Cendhec), Manoel Moraes, lembra que organismos internacionais também estão atentos ao que aconteceu no Recife e que isso gera um constrangimento ao Governo Estadual. “O Estado tem que ser garantidor da liberdade de expressão e das manifestações da sociedade”, enfatiza.

A Organização das Nações Unidas (ONU) e a Organização dos Estados Americanos (OEA) foram notificadas sobre as investigações dos episódios de violência protagonizados pela PMPE na emboscada do 29M e também sobre as apurações em torno do despejo de 200 famílias na zona rural de Amaraji.

Manoel fala também do cenário na América Latina para lembrar que o que acontece no Brasil não é um fato isolado. “Existe uma doutrina na América Latina de uma certa repressão à liberdade de expressão com medo que a sociedade assuma um protagonismo dentro da pandemia. Essa é uma visão ultrapassada, com uma perspectiva repressiva da força e da palavra”, coloca.

No domingo, 20 de junho, haverá um manifestação de motoqueiros a favor de Bolsonaro, nos moldes das que aconteceram em Brasília e São Paulo, a Acelera para Cristo. A saída da chamada Motociata Acelera Patriota será às 10h do Parque Dona Lindu, na avenida Boa Viagem, em direção ao Centro de Convenções, na entrada de Olinda. Os bolsonaristas pedem o fim das medidas restritivas e a volta do voto impresso.

Muitos manifestantes de direita e extrema direita têm gritado na ruas também por medidas que são inconstitucionais, como a derrubada do Supremo Tribunal Federal (STF), a volta do regime militar e de medidas como o Ato Institucional nº 5 (AI 5), o mais duro e violento da Ditadura Militar no Brasil.

29M Recife

Crédito: Arnaldo Sete

Atos Fora Bolsonaro confirmados em Pernambuco (até o momento)

  • Recife – Praça do Derby – 9h
  • Salgueiro – Av Agamenon Magalhães (entrada da feira) – 8h
  • Surubim –  Praça Dídimo Carneiro – 8h30
  • São José do Egito – Rua da Baixa – em frente à estátua do poeta – 9h
  • Petrolina – Praça Dom Malan/Catedral – 9h
  • Caruaru – Grande Hotel – 9h
  • Serra Talhada – Praça do Pajeú /Igreja N Sra da Penha –  15h30

MPPE recomenda que polícia evite excessos

O Ministério Público de Pernambuco (MPPE), através do 7º Promotor de Justiça de Defesa da Cidadania da Capital, Promoção e Defesa dos Direitos Humanos, Westei Conde y Martin Júnior, recomendou que a Secretaria de Defesa Social (SDS) e a PMPE evitem excessos na utilização da força e emprego inadequado de armas (letais e não letais). 

O promotor recomendou ainda que os PMs estejam devidamente identificados, com os nomes em local visível no uniforme e nos coletes balísticos. Em resposta ao ofício do MPPE, a SDS publicou a orientação no Boletim Geral e no seu site oficial e informou que a recomendação foi encaminhada às referidas operativas por meio do sistema de comunicação interna da instituição. 

As recomendações do promotor consideram os princípios e direitos fundamentais à liberdade de expressão, manifestação do pensamento e de reunião pacífica em locais abertos ao público, assim como à vida, liberdade, integridade física e psicológica. Consideram também o inquérito civil instaurado para investigar possíveis violações de direitos humanos, materializadas em atuação ilegal e arbitrária, cometidas pela PMPE no último Fora Bolsonaro.

Além dessa recomendação, o MPPE publicou, mais uma vez, a recomendação de que grupos que agendaram atos para este fim de semana se abstenham de qualquer tentativa de aglomeração. Há notificação para o 19J e também para a motociata bolsonarista.

Governo estadual pede que atos não aconteçam

Reunião da Mesa Permanente de Articulação com a Sociedade Civil (crédito: Élvano Nazir/SDS-PE)

Na quinta passada, 10 de junho, foi instituída a Mesa Permanente de Articulação com a Sociedade Civil com o objetivo de atuar na mediação de manifestações sociais. A mesa é composta pelas secretarias estaduais de Justiça e Direitos Humanos; Desenvolvimento Social, Criança e Juventude; Políticas de Prevenção à Violência e às Drogas; Defesa Social; Casa Civil; e Ministério Público de Pernambuco.

No primeiro encontro, na última segunda, 14 de junho, “a mesa repassou algumas orientações para os movimentos sociais, enfatizando que eles ainda se abstenham de realizar quaisquer atos que ocasionem aglomerações de pessoas”, segundo o comunicado enviado à imprensa. 

Nem todos os movimentos estavam presentes nesse dia, assim a avaliação foi que não daria para analisar coletivamente que debate seria feito na ocasião nem tomar decisões para serem levadas à reunião. A maioria das presenças foi de movimentos estudantis e de juventude.

Na terça, 15 de junho, houve um novo encontro, dessa vez com participação da organização da motociata pró-Bolsonaro marcada para o domingo, 20 de junho. Para esta quarta, 16 de junho, à tarde, foi agendado mais um encontro. 

Outra recomendação geral é que não haja uso de carros de som ou quaisquer equipamentos similares, “paredões”, reboques ou mini-carros e mini-trios elétricos. No 29M, já na concentração o carro de som foi impedido pela polícia de circular.

Apesar do pedido para não realização do 19J, a SDS afirmou que “irá garantir o direito de livre manifestação e reunião, previstos na carta magna, desde que observadas as orientações aqui estabelecidas”, de distanciamento e segurança sanitária. O governo disse ainda que haverá servidores acompanhando o evento estabelecendo e mantendo canal de diálogo com as lideranças.

O governo também afirmou que serão “observados todos os fundamentos necessários na garantia dos direitos humanos, sempre com foco na não utilização da força”. Caso ela seja indispensável, “será usada em fiel observância aos preceitos legais delimitadores, que garantam a devida e clara identificação de todo o efetivo escalado para acompanhamento dos eventos e que informem sobre o acatamento das recomendações propostas”.

Atualizada em 17/6/21, às 15h10

AUTOR
Foto Raíssa Ebrahim
Raíssa Ebrahim

Vencedora do Prêmio Cristina Tavares com a cobertura do vazamento do petróleo, é jornalista profissional há 12 anos, com foco nos temas de economia, direitos humanos e questões socioambientais. Formada pela UFPE, foi trainee no Estadão, repórter no Jornal do Commercio e editora do PorAqui (startup de jornalismo hiperlocal do Porto Digital). Também foi fellowship da Thomson Reuters Foundation e bolsista do Instituto ClimaInfo. Já colaborou com Agência Pública, Le Monde Diplomatique Brasil, Gênero e Número e Trovão Mídia (podcast). Vamos conversar? raissa.ebrahim@gmail.com