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Juninho, ex-jogador do Salgueiro, e a família andam 60 quilômetros a pé, mas não conseguem sair da Ucrânia

Inácio França / 27/02/2022

Crédito: reprodução instagram

O lateral-esquerdo do Zorya Luhansk e ex-jogador do Salgueiro, Juninho Reis e sua família ainda não conseguiram sair da Ucrânia. Em Salgueiro e no Recife, os parentes de sua esposa, a pernambucana Vitória Magalhães Nunes Reis, entraram em pânico e passaram a enviar mensagens e e-mail pedindo ajuda para tirá-los do palco da guerra com a Rússia depois que passaram a receber os vídeos e áudios postados no Instagram ou enviados no grupo de Telegram da família.

Com Juninho e Vitória estão seu filho Benjamin, de apenas três anos, e os também jogadores Guilherme Henriques da Silva Carvalho, conhecido como Guilherme Smith, de 18 anos, e Cristian Daniel Dal Bello Fagundes, de 22 anos, ambos atacantes do mesmo clube. Logo depois da invasão faz tropas russas, o grupo conseguiu sair de trem de Zaporizhzhya, no leste do país, bem perto na fronteira da Rússia.

De trem, conseguiram percorrer os quase 950 quilômetros até Lviv, no oeste da Ucrânia, onde a embaixada brasileira havia prometido apoio para retirá-los do país. Em Lviv, porém, não havia ajuda oficial brasileira. De acordo com Thays Magalhães, a irmã de Vitória que mora em Salgueiro, o grupo pôde contar com um carro com motorista, contratado pelo empresário dos atletas. A ideia era seguir até a fronteira com a Polônia, distante 71 quilômetros. “Mas não conseguiram andar nem 10 quilômetros de carro porque a estrada estava congestionada”, explicou Thays em áudio para a Marco Zero.

O motorista voltou, mas Juninho, a esposa e os colegas decidiram acompanhar a pé a multidão que seguia a pé até a fronteira. De acordo com os relatos recebidos pelos parentes e pelos vídeos postados nas redes sociais, passaram o dia de sábado caminhando para vencer os 60 quilômetros até o ponto de travessia para o território polonês. Os adultos se revezaram para carregar as malas e levar o pequeno Benjamin no colo.

Fronteira fechada e maus tratos

A 15 quilômetros da fronteira, no final da tarde no Brasil e pouco antes de 22h na Ucrânia, conseguiram encontrar um café aberto em um posto de gasolina, de onde Juninho gravou um vídeo otimista, dizendo que estavam perto da Polônia. “Agora a gente sente que tá mais perto. Se não me engano, faltam só 15 quilômetros. Tá, não é tão perto, mas o que são 15 quilômetros para a gente que já andou isso tudo?”. Logo depois, em um vídeo em que Vitória aparece de costas levando o filho pela mão, Juninho mostrava-se entusiasmado: “A luta continua, galera!”. O otimismo acabou aí.

Na fronteira, nada deu certo. Sob -2ºC e com os pés feridos de tanto caminhar, Juninho, Vitória, Guilherme, Cristian e o menino Benjamin foram empurrados por militares ucranianos, além de sofrerem maus tratos que a família no Brasil não soube detalhar. A partir daí, o desespero tomou conta do grupo. De madrugada, pouco antes de acender uma fogueira na calçada, Juninho postou um vídeo admitindo que a situação era “desesperadora” e que tinham usado tudo disponível para agasalhar o filho.

“Fizeram promessas pra gente, demos tudo pra chegar até aqui e não tinha nada nos esperando”, lamenta o jogador. Daniel Magalhães, primo da esposa do jogador não soube dizer se era uma referência ao serviço diplomático brasileiro ou ao empresário de futebol..

Veículos da mídia internacional publicaram relatos de que estudantes de países africanos contaram que negros estavam sendo vítimas de racismo tanto de um lado quanto de outro da fronteira. Na Ucrânia, negros estariam sendo colocados no final da fila para embarcar nos trens de evacuação e só podiam entrar se os brancos não ocupassem todos os lugares. Na Polônia, refugiados com passaporte de países da África simplesmente não estariam sendo aceitos.

Uma das primeiras a relatar isso foi a jornalista britânica Stephanie Hegarty, da BBC:

Próximo destino: Romênia

Thays Magalhães contou que, na divisa entre os dois países, o grupo decidiu voltar para Lviv, porém como havia previsão de neve e o cansaço era grande, não conseguiriam fazer a viagem a pé novamente. “Foram de carro. Conversaram com um motorista que aceitou dar carona”. Na manhã de hoje, os parentes de Vitória receberam mais tranquilizadoras: estavam todos em um hotel que teria sido reservado pela Embaixada brasileira.

Em mais um vídeo, Juninho confirmou já de manhã em Lviv que, mesmo sem conseguir ter acesso aos quartos por causa da superlotação, estavam todos em segurança, apesar das feridas nos pés e do extremo cansaço.

No início da tarde domingo, Vitória informou à família que, amanhã, tentariam sair do país através da fronteira com a Romênia, provavelmente pelas cidades romenas de Satu Mare ou Radauti, ambas a pouco mais de 300 quilômetros de Lviv e mais distante da linha de frente. Diplomatas brasileiros já teriam sido contactados em Bucareste, capital romena, para que pudessem facilitar a travessia da fronteira. Além disso, há notícias de que há mais receptividade aos refugiados por parte dos dos romenos do que na Polônia.

AUTOR
Foto Inácio França
Inácio França

Jornalista e escritor. É o diretor de Conteúdo da MZ.