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Mulheres da Paraíba voltam a marchar em protesto contra impactos dos parques eólicos

Géssica Amorim / 17/03/2023
Mulheres camponesas em fila indiana, usando chapéus de palha, e roupas diversas, em um espaço público. Ao fundo, há estandartes coloridos com alusão à marcha das mulheres e organizações feministas

Crédito: Géssica Amorim/Coletivo Acauã

por Géssica Amorim, do Coletivo Acauã

Pela segunda vez consecutiva, a agricultora Roselma de Melo, 35, participa da Marcha pela Vida das Mulheres e pela Agroecologia organizada pela coordenação de mulheres do Polo da Borborema, na Paraíba. Esse ano, ela viajou cerca de 280 quilômetros, de Caetés, em Pernambuco, até o município paraibano de Montadas, onde aconteceu, na última quinta-feira (16), a 14° edição da marcha. 

Roselma compareceu ao evento para compartilhar com os quase 5 mil agricultores e agricultoras presentes os problemas e as angústias que sua família e seus vizinhos estão vivendo desde 2015, ano da instalação das torres dos aerogeradores do Complexo Eólico Ventos de São Clemente, na zona rural de Caetés.  

Na última edição da marcha, a agricultora conversou com a repórter Giovanna Carneiro, da Marco Zero Conteúdo, sobre os danos que essas instalações trouxeram para a sua vida e de seus familiares. Um ano depois, durante o nosso encontro em Montadas, o depoimento da agricultora traz a confirmação de que a produção de energia eólica não é livre de impactos negativos e o seu discurso reforça a necessidade de atenção para o fato de que, além da transformação na paisagem e na vegetação nativa dos territórios onde as torres são instaladas,  há o impacto direto na vida dos moradores e moradoras das proximidades dos locais os aerogeradores são instalados.

Desde então, pouca coisa mudou na vida de Roselma e da sua comunidade.

“O primeiro problema é que eles ficaram em cima das nossas casas. Depois, começaram os problemas de saúde do pessoal: depressão, ansiedade, problemas de audição. A comunidade inteira está com esses problemas. Pra dormir, mesmo, tem que ser à base de medicamento”.

No palco da Marcha, Roselma revela que faz uso constante de ansiolíticos e antidepressivos, desde que as torres foram instaladas no Sítio Sobradinho, comunidade rural de Caetés, onde ela vive. “Eu desenvolvi problemas de ansiedade e depressão, preciso tomar remédio pra controlar isso e pra dormir. Uma das torres está a 160 metros da minha casa, nós moramos dentro do parque, praticamente. É um barulho que não tem fim, parece um avião que não pousa nunca. Aquele barulho o tempo inteiro na nossa cabeça. Eu estou aqui pra tentar alertar as pessoas, pra não deixarem acontecer por aqui o que aconteceu com a gente”. 

Licença para eólica portuguesa

Este ano, a Marcha pela Vida das Mulheres e pela Agroecologia foi realizada em Montadas porque o município está localizado numa região da Paraíba onde empresas já têm licenças emitidas pelo estado para instalar parques eólicos. 

Na última quarta-feira (15), o governador João Azevêdo (PSB) recebeu representantes da multinacional portuguesa EDP Renováveis para tratar sobre a instalação de parques nos municípios de Pocinhos e Areial, localizados no território da Borborema. 

O projeto tem o nome de Serra da Borborema e está em fase de licenciamento. A previsão é de que as obras de implantação sejam iniciadas em outubro deste ano, com a instalação de, pelo menos, 21 aerogeradores. 

A 14ª edição da Marcha pela Vida das Mulheres e pela Agroecologia denunciou a contradição na produção industrial da energia renovável, que é tida como limpa, mas que empobrece e adoece muitas famílias rurais.  

Justamente no Dia Nacional da Conscientização sobre as Mudanças Climáticas, quando a marcha foi realizada, a AS-PTA Agricultura Familiar e Agroecologia entra nessa discussão com a provocação: “Afinal de contas, a energia gerada a partir do vento e do sol é limpa mesmo?”

A organização entende, obviamente, que produzir energia renovável é importante para o planeta e para toda a sua população, mas, segundo Adriana Galvão, assessora técnica da AS-PTA, atualmente, “a solução que está sendo construída é meramente baseada numa relação de mercado. Se propõe a troca de uma matriz energética, com base nos combustíveis fósseis, por outra, baseada na energia renovável, sem entender o desequilíbrio socioambiental que afeta as populações dos lugares onde estão sendo instalados os parques eólicos e as usinas solares”.

A Marcha  pela Vida das Mulheres e pela Agroecologia teve início por volta das 9h, saindo da na praça Josefa Tavares, no centro de Montadas e depois fez um percurso de 1,5 quilômetro até voltar para o ponto de partida. A presença da cirandeira Lia de Itamaracá animou os participantes no encerramento do evento.

Há um ano, Roselma contou para a MZ como os aerogeradores a afetavam. De lá pra cá, nada mudou. Crédito: Géssica Amorim/Coletivo Acauã

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