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Escolha difícil na eleição de Pernambuco

Marco Zero Conteúdo / 23/08/2022

Adversárias na disputa estadual, militâncias de Danilo Cabral (PSB), Marília Arraes (Solidariedade) e de João Arnaldo (Psol) participaram de evento de Lula no Classic Hall, no Recife. Crédito: Arnaldo Sete/Marco Zero Conteúdo.

Por Carmen Silva*

Foi dada a largada. A campanha eleitoral está nas ruas. Mas ainda não pegou pique e nem volume. Depois de quase três anos de vida em pandemia, seis anos pós golpe parlamentar misógino contra a presidenta Dilma Roussef, passando pela prisão do presidente Lula, estamos na expectativa ainda que a campanha se agigante em mobilização popular. Com o começo dos grandes comícios semana passada e as entrevistas na emissora prateada por estes dias, se imagina que vai começar a esquentar. Enquanto isso, em Pernambuco, o embate segue nas mídias, reuniões, e tímidas bandeiras tremulando nos semáforos.

O volume de campanha não é apenas uma produção mercadológica. Historicamente tem muito a ver com adesão popular. E mais ainda, com o peso dos movimentos sociais e partidos de esquerda que tinham/têm atuação militante. Para crescer é preciso mais que pessoas pagas nas esquinas segurando bandeiras ao mesmo tempo em que olham o celular, é preciso a força viva do desejo de mudança que a militância tem e se expressa em número de pessoas nas ruas, em adereços nos carros e bicicletas, em camisetas estampadas no peito, em postagens espontâneas nas redes sociais e mais uma serie de manifestações. Esta semana que se inicia irá ser palco do crescimento deste desejo.

É preciso eleger Lula com uma grande campanha de rua, que paute no debate o projeto de bem viver para as maiorias deste país, e que encerre o jogo no primeiro turno. Isso pode acontecer e permitirá que a sua força, ao governar, seja maior. Embora as alianças construídas não sejam politicamente confortáveis para as pessoas de luta, é preciso agarrar esta possibilidade de imprimir uma forte derrota ao bolsonarismo miliciano e fundamentalista.

Além de garantir a vitória de Lula, ao mesmo tempo, as ruas e as redes são o espaço para construir uma grande bancada de esquerda no Congresso Nacional, o que não está fácil. As candidaturas proporcionais, por mais fortes e aguerridas que sejam, precisam de candidaturas majoritárias que puxem a campanha para cima, dando volume e consistência programática. Lula não pode ser o único puxador, até porque ele virou uma espécie de salvação nacional, ao qual todo mundo pode aderir.

Em Pernambuco o cenário eleitoral está muito complexo. Não represento aqui uma visão de conjunto da militância de esquerda, libertária, autônoma, de movimentos sociais e de partidos que se afinam com ela. Quero expressar, entretanto, a partir do lugar de militante feminista, um sentimento que chega a mim de vários coletivos que lutam por direitos e pessoas conscientes e preocupadas com os rumos das eleições em nosso estado, especialmente as majoritárias, mas sabendo que elas podem ter forte impacto sobre as proporcionais.

Tudo indica que a composição da chapa da maioria do eleitorado, considerando o voto para as majoritárias e para as proporcionais, não siga critérios programáticos e/ou partidários muito coerentes. Nem mesmo a votação da militância de esquerda, que é objeto desta reflexão aqui. Muita gente está compondo seu voto misturando partidos de direita, de centro e de esquerda, porque as ofertas também não estão muito coerentes e ai muitos se fixam nas trajetórias individuais de cada candidatura, o que, por sua vez, rebaixa o debate programático.

As candidaturas majoritárias para Senado e Governo do Estado têm um espectro político amplo, mas numericamente muito masculino e fortemente marcado pelas heranças familiares de poder, que são constantes no nosso sistema político nada afeito à renovação e à juventude. Para o Senado da República a escolha é mais simples. Temos duas candidaturas de mulheres de esquerda representativas de nossas pautas, da luta sindical e da cultura. Teresa Leitão, pelo PT, e Eugenia Lima, pelo PSOL, são possibilidades para a escolha de quem quer fortalecer os rumos da retomada de direitos em nosso país. As possibilidades de vitória hoje se apresentam mais para uma do que para outra, até porque são trajetórias políticas e leque de alianças muito diferentes. Todavia, vencer ou marcar posição pelo voto é uma definição que só existe na reta final da campanha.

Para o Governo do Estado, temos uma miríade de candidaturas que vai da extrema direita bolsonarista até aos partidos que se postam à esquerda de Lula, porém nenhuma daquelas que hoje aparecem com possibilidades de vitória defendem historicamente as pautas feministas populares. A maior tarefa nesta eleição em Pernambuco é combater o inimigo principal, impedir que aqui se fortaleça, com o governo, o bolsonarismo que queremos extirpar de nossa vida nacional. Daí, que um bom critério para escolha de candidata ou candidato a governador/a é o apoio a Lula para presidente da República. Mas, desta vez, muita gente apoia Lula.

Nas pesquisas de intenção de voto temos duas candidaturas de mulheres à frente, uma com larga vantagem e a outra variando entre segundo e terceiro lugar, em diferentes levantamentos de opinião. Isso poderia ser motivo de alegria para o movimento feminista, mas não é. Como já disse na quinzena anterior, representatividade importa, mas não é tudo. É preciso compromisso programático com nossas causas, e isso se faz ao longo de uma carreira política e não apenas no momento eleitoral. Ainda mais quando se faz questão de manifestar-se publicamente contra a legalização do aborto, sendo o aborto a principal causa de morte materna e sua criminalização um dos principais mecanismos legais de controle patriarcal sobre o corpo das mulheres.

Existe a hipótese de, em Pernambuco, a eleição para governo ser definida no primeiro turno. Mas é improvável. Existem cinco candidaturas fortes na disputa, entre as quais, uma à frente com largueza, o que garante a ida para o segundo turno, e quatro emboladas disputando segundo lugar, entre elas o candidato oficialmente apoiado pelo presidente Lula, mas que carrega nas costas os anos de domínio do seu partido no estado de Pernambuco e seu descaso com a vida do povo, além do seu próprio clamor entusiasta no momento do golpe de 2016. Claro que o chamado ‘peso da máquina’ e o apoio de Lula podem alavancar esta candidatura, mas, sem dúvida, a disputa irá para o segundo turno.

Pensando que a eleição para governo é em dois turnos, talvez a escolha seja mais fácil. Sim, porque o voto no primeiro turno pode ser mais de acordo com suas convicções políticas, com partidos e/ou visões de mundo que te interessa fortalecer na democracia brasileira. É aí que as candidaturas mais à esquerda podem crescer. Mas isso depende da capacidade de articulação e do fomento ao debate programático, construído a partir das pautas das lutas sociais. O discurso indiferenciado e insosso é o maior adversário deste campo político. Das posições programáticas adotadas depende o crescimento ou não das campanhas de esquerda para o Governo do Estado, mas sem esperança que uma delas chegue ao segundo momento da disputa.

No segundo turno, ocorrem novas composições político partidárias, e é possível configurar um novo espectro político nas candidaturas em disputa. O voto da militância de esquerda pode ir para aquela candidatura que apoiou Lula no primeiro turno. Na hipótese das duas terem feito isso, pode ir para a candidatura que o apoiou desde sempre. Parece apenas um jogo de palavras, mas pode ser uma estratégia para definições individuais e/ou para a escolha política de coletivos e movimentos que têm disposição para entrar na campanha eleitoral, contribuindo com esse momento histórico.

* Carmen Silva é socióloga, constrói o SOS Corpo Instituto Feminista para a Democracia, é militante do Fórum de Mulheres de Pernambuco e da Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político.

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