Apoie o jornalismo independente de Pernambuco

Ajude a MZ com um PIX de qualquer valor para a MZ: chave CNPJ 28.660.021/0001-52

Jovens ativistas confrontam Raquel Lyra durante a COP28 por causa da Escola de Sargentos

Raíssa Ebrahim / 11/12/2023

crédito: Engajamundo

Um grupo de jovens ativistas presentes na COP28, a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, em Dubai, nos Emirados Árabes, aproveitou a presença da governadora de Pernambuco, Raquel Lyra (PSDB), no evento para protestar contra o desmatamento para a construção da Escola de Sargentos. Previsto para ser erguido pelo Exército numa mata dentro da Área de Proteção Ambiental (APA) Aldeia-Beberibe, na Região Metropolitana do Recife, o megaempreendimento deve desmatar 130 hectares de mata atlântica regenerada.

A juventude do Engajamundo, organização socioambiental nacional formada e liderada por jovens ativistas com 10 anos de existência, exibiu, em painel, na semana passada, cartazes que diziam “Exigimos desmatamento zero! Não ao desmatamento da Mata Atlântica pernambucana” e “Não permita que o Exército desmate a Mata Atlântica em Pernambuco”. Ao final do evento, o grupo questionou Raquel sobre a previsão de desmatamento para saber se o Governo de Pernambuco defende ou não a realocação da Escola de Sargentos para uma área já degradada.

Ambientalistas, alguns parlamentares, movimentos socioambientais e indígenas têm pressionado Exército e Governo do Estado por uma alternativa locacional para que não haja desmatamento. Se saírem do papel, a Escola e o Arco Metropolitano podem, juntos, derrubar mais de 336 mil árvores em área de mata atlântica. Essa foi uma das conclusões do estudo realizado pelas universidades Federal de Pernambuco (UFPE), Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), Federal de Alagoas (UFAL) e o Fórum Socioambiental de Aldeia, organização que reúne moradores e amigos da APA, cujo território se espalha por oito municípios (Abreu e Lima, Araçoiaba, Camaragibe, Igarassu, Paudalho, Paulista, Recife e São Lourenço da Mata).

Jovem ativista questiona a governadora Raquel Lyra sobre o desmatamento na APA Aldeia-Beberibe durante a COP28. Crédito: Engajamundo

Com os jovens, Raquel seguiu a linha do que o governo tem dito em público sobre o projeto da Escola: que ele ainda não está concluído e que tem trabalhado para que haja responsabilidade com as questões ambientais. A gestora, porém, não comentou sobre a possibilidade de haver mudança de local do empreendimento nem avaliou a questão do desmatamento.

Em nota à Marco Zero, o Governo de Pernambuco informou que, em Dubai, a governadora “esclareceu que o projeto está sendo discutido por um grupo de trabalho para estabelecer um olhar global sobre a construção, com atenção especial à pauta ambiental” e “também explicou que a Escola de Sargentos é uma oportunidade importante de geração de emprego e desenvolvimento econômico para Pernambuco e que pode ser executada através de um trabalho com sintonia e responsabilidade com a pauta ambiental”.

Na ocasião, a gestora também mencionou que “já participou de diversas reuniões com membros do Exército Brasileiro e com o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, para debater a instalação do equipamento no Estado” e ressaltou que, há cerca de seis meses, foi criado um grupo de trabalho que reúne órgãos e secretarias estaduais, representantes do Ministério Público, da Assembleia Legislativa, da academia e sociedade civil. “O projeto final ainda não está concluído”, frisou.

Em julho, a reportagem mostrou que, entre 20 assentos do Grupo de Trabalho criado pelo Estado, somente um foi destinado à sociedade civil organizada. E apenas na condição de convidada.

O projeto do Exército já foi debatido em duas audiências públicas na Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe), convocadas pelo deputado Renato Antunes (PL). O Exército apresentou o projeto à sociedade, garantiu o uso de tecnologias para diminuir os impactos e que haverá compensação ambiental.

No dia 28 de novembro, um dia após a segunda audiência, quando subiram à tribuna ambientalistas, Raquel sobrevoou, junto a representantes do Comando Militar do Nordeste (CMNE), a área em que será construída a Escola. “O Governo do Estado está presente para garantir a construção da Escola de Sargentos em Pernambuco sem abrir mão da pauta ambiental, para que possamos ter um legado de ação social, de sustentabilidade econômica e de sustentabilidade ambiental por um projeto tão importante para o desenvolvimento desta região”, afirmou a governadora, sem dar maiores detalhes.

A Escola de Sargentos, a 33 quilômetros do Recife, será, na verdade, uma cidade militar, com capacidade para receber 6,2 mil pessoas, dentro da mata do Campo de Instrução Marechal Newton Cavalcanti (Cimnc), pertencente e preservada há décadas pelo Exército. Um investimento de quase R$ 1,8 bilhão.

O local é tratado como uma espécie de santuário por abrigar mata atlântica regenerada, nascentes e mananciais que alimentam o Sistema Botafogo, responsável por prover água a cerca de um milhão de pessoas na Metropolitana Norte. O Cimnc é apelidado por ambientalistas de “Amazônia da Região Metropolitana do Recife”. Com 7,5 mil hectares de mata atlântica regenerada, é a maior faixa contínua acima do rio São Francisco de um dos biomas mais ameaçados do planeta.

Em Dubai, Raquel lança plano e anuncia investimentos

Raquel Lyra anunciou o Plano PerMeie e investimentos para a Caatinga e hidrogênio verde em Suape. Crédito: divulgação

Na COP 28, em Dubai, Raquel Lyra fez uma série de anúncios. Um dos lançamentos foi o Plano Pernambucano de Mudança Econômico-Ecológica (PerMeie), que, nas palavras da governadora, “trabalha o reposicionamento da economia de Pernambuco com um olhar para a sustentabilidade e mudança climática”.

A iniciativa, transversal a todas as secretarias do estado, baseia-se em sete pilares de atuação: indústrias sustentáveis; transição energética ágil, responsável e justa; ativos ambientais e mercado de carbono; agricultura familiar resiliente; educação técnica, pesquisa, desenvolvimento & inovação; governo sustentável; e Noronha sustentável.

Desenhado sob as diretrizes da Economia ASG (Ambiental, Social e de Governança), o plano tem, entre as práticas previstas, soluções de baixo carbono, proteção a unidades de conservação, estratégias para incentivar o hidrogênio verde e a energia solar, fortalecimento da economia circular e criação de rede de reflorestamento.

Presente no evento, a secretária de Meio Ambiente, Sustentabilidade e Fernando de Noronha, Ana Luiza Ferreira, destacou que o PerMeie tem compromisso com a preservação de biomas como a Caatinga. Quem também acompanhou Raquel na COP28 foi o secretário estadual de Desenvolvimento Econômico, Guilherme Cavalcanti.

“A partir do PerMei, o Estado de Pernambuco se tornará referência em transição energética, economia sustentável e agricultura familiar. Iremos trabalhar com um pacote de ações que nos lançará ao futuro”, valorizou, em fala ambiciosa.

Durante a conferência, a governadora também anunciou a Estratégia Estadual de Hidrogênio Verde, incluindo um investimento de R$ 20 milhões do governo na planta experimental de produção de H2V instalada no Porto de Suape. A gestão já encaminhou e está em tramitação na Alepe um Projeto de Lei que visa fundamentar as diretrizes da Política Estadual sobre o Hidrogênio Verde.

A chefe do Executivo Estadual também anunciou um investimento de R$ 60 milhões para pesquisa e preservação da caatinga. Desse montante, R$ 30 milhões são de recursos próprios do governo pernambucano, oriundos de compensação ambiental da Agência Estadual de Meio Ambiente (CPRH), e os outros R$ 30 milhões foram assinados, na manhã desta sexta-feira (1°), junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), por meio do Programa Floresta Viva.

É a primeira assinatura no Nordeste com foco no bioma. Segundo o governo, Pernambuco tem 135 municípios nas Áreas Suscetíveis à Desertificação (ASD), onde vivem mais de 2,5 milhões de pessoas.

A viagem da equipe do Governo de Pernambuco aconteceu a convite da Bloomberg Foundation, que custeou passagens aéreas e hospedagens. Na comitiva, também estava o secretário Estadual de Comunicação, Rodolfo Costa Pinto.

Uma questão importante!

Se você chegou até aqui, já deve saber que colocar em prática um projeto jornalístico ousado custa caro. Precisamos do apoio das nossas leitoras e leitores para realizar tudo que planejamos com um mínimo de tranquilidade. Doe para a Marco Zero. É muito fácil. Você pode acessar nossapágina de doaçãoou, se preferir, usar nossoPIX (CNPJ: 28.660.021/0001-52).

Apoie o jornalismo que está do seu lado

AUTOR
Foto Raíssa Ebrahim
Raíssa Ebrahim

Vencedora do Prêmio Cristina Tavares com a cobertura do vazamento do petróleo, é jornalista profissional há 12 anos, com foco nos temas de economia, direitos humanos e questões socioambientais. Formada pela UFPE, foi trainee no Estadão, repórter no Jornal do Commercio e editora do PorAqui (startup de jornalismo hiperlocal do Porto Digital). Também foi fellowship da Thomson Reuters Foundation e bolsista do Instituto ClimaInfo. Já colaborou com Agência Pública, Le Monde Diplomatique Brasil, Gênero e Número e Trovão Mídia (podcast). Vamos conversar? raissa.ebrahim@gmail.com