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Crédito: Secom/PE
Depois de 16 anos sob o comando do mesmo grupo político, Pernambuco elegeu no ano passado sua primeira mulher governadora, Raquel Lyra (PSDB). Os primeiros três meses do governo, porém, foram turbulentos para a máquina estadual: em um dos primeiros atos de governo, Raquel Lyra simplesmente exonerou todos os cargos comissionados, sem que houvesse a troca imediata por outros profissionais. Até hoje, há cargos que ainda estão vagos e outros que já têm indicação, mas ainda esperam a nomeação.
A Marco Zero conversou com deputados, sindicalistas e analistas para fazer um balanço das primeiras impressões do governo Raquel Lyra. Um ponto recorrente é de que o decreto da exoneração foi um erro que gerou um efeito dominó neste início de governo, que ainda não conseguiu se organizar e dizer qual será o direcionamento para os próximos anos.
Para o presidente do Sindicato dos Servidores de Pernambuco, Renilson Oliveira, os últimos meses passaram os sentimentos de um governo de improviso. “Foram três meses de mandato, mais os dois meses de transição, e um órgão importante como o Departamento de Estradas de Rodagem (DER) só teve o seu presidente nomeado há uns de 15 dias. A Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia do Estado (Facepe) segue sem nomeação”, diz. “A máquina parou no mês de janeiro. Foi terrível, teve servidor que só recebeu o salário no dia 16 de fevereiro, porque o órgão que trabalhava estava sem ordenador de despesa”, criticou Renilson.
O sindicalista afirma que essas atitudes passam a imagem de um desconhecimento da máquina pública e também de uma falta de quadros dentro do grupo político da governadora. “Não estou dizendo como ela deve governar, nem que ela deveria ter mantido os gestores anteriores. A nossa avaliação é de que o governo se comporta como um governo de improviso, como se não conhecesse nada de administração pública. Mas o currículo dela não diz isso. Ela foi deputada, foi secretária de governo, foi prefeita de uma cidade importante de Pernambuco. Ela sabe o que é a máquina pública. Mas uma coisa é gerir um município que tem 10 mil, 15 mil servidores. Outra coisa é um estado com 215 mil servidores. Teria sido mais eficiente exonerar e no dia seguinte sair a nomeação do substituto no Diário oficial, mas houve um delay muito longo”, avalia.
Presidente do Sindicato dos Policiais Civis (Sinpol), Rafael Cavalcanti afirmou que entende que não é fácil mudar de um modelo de governo para outro, ainda mais depois de quatro mandatos consecutivos de um mesmo grupo político. “Há a necessidade de mudar as peças-chaves para implementar as políticas públicas que esse novo governo quer. Mas o que estamos vendo, na verdade, é que os servidores, e os policiais, em especial, estão muito ansiosos para que os compromissos assumidos na campanha, inclusive aqui no próprio sindicato, comecem a sair do papel. Segurança pública é um pilar fundamental de qualquer governo”, diz.
O sindicalista afirma que há péssimas estruturas físicas para a segurança pública em Pernambuco. “Temos também uma categoria completamente adoecida. Viemos de oito anos de um governo que não dialogava praticamente nada com a classe. Na semana passada, mais um policial se suicidou. Isso vem se agravando. O discurso da governadora foi de uma atenção muito forte com a saúde mental do policial e das condições de trabalho. Vamos passar a cobrar mais efetivamente o governo. Tínhamos uma expectativa muito grande com esse governo e ainda estamos aguardando. Precisamos de disponibilidade de diálogo para avançar no médio e longo prazo, e não só com questões emergenciais”, afirmou.
Líder do governo na Assembleia, o deputado Izaías Régis (PSDB) afirma que “os três primeiros meses do governo Raquel Lyra se assemelham aos três primeiros meses de qualquer pessoa que assume uma responsabilidade executiva em um primeiro mandato”.
Para o deputado, Raquel Lyra tem tido o cuidado para conhecer toda a estrutura do estado, que é complexa. “Esse zelo e responsabilidade que ela apresenta pode fazer com que algumas coisas aconteçam em um ritmo mais lento no início, mas é extremamente necessário para evitar erros de condução. O resultado lá na frente será o de um estado austero, em que os serviços chegarão com mais eficiência a todos os pernambucanos e pernambucanas”.
Izaías Régis também lembrou que não é fácil começar um novo governo depois que o mesmo grupo político passou 16 anos no poder. “Um período em que, claro, existiram acertos, mas existiram muitas falhas também, e a governadora está atenta a manter o que deu certo, mas também implantar um novo modelo de gestão para consertar e fazer ser eficiente o que não deu certo. Nós temos o pior estado da federação em termos de segurança pública, um dos piores em saúde pública, e nada disso se resolve em três meses, nem mesmo demandas menores”, afirma.Na área de segurança pública, uma reivindicação da sociedade civil que foi adota pelo novo governo foi a antecipação da data de divulgação de estatísticas de violência.
A MZ tentou falar com a governadora e o presidente da Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe), Álvaro Porto, do mesmo partido e aliado de Raquel, mas não obteve respostas.
A transição do governo de Paulo Câmara (PSB) para o de Raquel Lyra (PSDB) foi comandada pela vice-governadora Priscila Krause. Ao final, foi apresentado um relatório que apontava 400 obras paralisadas e que seria necessário aproximadamente R$ 5 bilhões para concluí-las. Mas foi uma transição que não aprofundou as alianças políticas, nem fez um diagnóstico da eficiência de cada órgão estadual ou como seriam as trocas de chefias.
O deputado João Paulo (PT) afirmou que, apesar da boa intenção da governadora, o governo começou com o pecado original de não haver uma transição eficiente. “A falta de transição implicou em que até as ações positivas do governo passado não tiveram continuidade”, afirma. Ele cita a falta de pagamento do 13º estadual para os beneficiários do Bolsa Família. “Um benefício importante para as pessoas mais pobres, principalmente do campo, e não foi pago ainda por falta de ordenador de despesa”, denuncia.
Líder do PSB na Alepe, o deputado Sileno Guedes, da bancada de oposição, disse que há uma lentidão no governo Raquel Lyra. “Há muita hesitação. Muita coisa que poderia entrar em prática é adiada. Esperamos que o governo comece a governar. Que faça as nomeações, consolide as equipes, consolide as alianças políticas. Infelizmente temos visto muito pouco acontecer”, disse.
Para Rosa Amorim, também do PT, não dá mais para esperar. “Precisamos ver ações. A saúde pede socorro, os profissionais precisam de assistência. É um governo de muitos desafios”, disse a deputada, que faz parte da bancada independente na Alepe.
Deputado pela primeira vez, Eriberto Filho (PSB) ponderou que é um governo que ainda está muito no começo. “Está se organizando. Estamos caminhando a pequenos passos, dando um tempo para ver qual vai ser a cara do governo Raquel Lyra, o que ela vai trazer para Pernambuco”, disse.
Finalizado os três meses de “adaptação”, o deputado João Paulo considera que o atual governo está em uma posição mais favorável do que seu antecessor. “No encontro que os deputados tiveram com Raquel Lyra, eu disse que ela tem muita sorte, pois não está governando com um presidente genocida, que era o Bolsonaro, mas com Lula, que é um republicano.Agora é esperar que Raquel Lyra tome as rédeas do governo”, afirmou.
Nestes três meses de governo, um gesto público marcante com os movimentos sociais foi quando a governadora desceu do palácio do Campo das Princesas e recebeu uma comissão de ativistas após a Marcha das Mulheres, no dia 8 de março. Ela também ampliou o horário das delegacias das Mulheres, que passaram a ser 24 horas.
Para a socióloga Carmen Silva, do SOS Corpo, apesar de ser pouco tempo para uma análise, o início do governo ainda não sinalizou ações concretas no enfrentamento da situação das mulheres, da população negra nem da juventude. “Pelo contrário, tivemos sinalizações de que nesse período o governo Raquel Lyra demonstra fortes alianças com o fundamentalismo religioso”, diz a socióloga, citando o episódio da substituição do secretário executivo responsável pela política de drogas.
Ela elogia a ampliação das delegacias e o fato de Raquel ter recebido as reivindicações das feministas, mas lembra que é necessário uma política integrada. “Só uma rede integrada de atendimento às mulheres em situação de violência é capaz de coibir a alta taxa de feminicídio e de transfeminicídio e de possibilitar às mulheres saírem da situação de violência. Isso passa por atendimento psicológico, passa por trabalho e renda, passa por acompanhamento da situação dos filhos. Muitas vezes por problema de moradia, então é preciso uma política integrada, não só fazer as delegacias”, avalia.
É também preciso que as ações em benefício das mulheres sejam expandidas para além do enfrentamento á violência. Segundo Carmen, quando a governadora anuncia a possibilidade de privatização da Compesa ela faz uma política que prejudica principalmente as mulheres. “São as mulheres que ainda são responsabilizadas socialmente pela execução do trabalho doméstico em suas casas, pelo cuidado com crianças, com idosos. E para tudo isso é necessário água”, diz. “Ao falar de privatizar Compesa, a governadora faz um gol contra não só no desenvolvimento de Pernambuco como contra as mulheres. Sabemos que a privatização vai implicar em aumento de preço e redução do produto, que é a mesma coisa que aconteceu com a privatização da Celpe”, afirma.
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Jornalista pela UFPE. Fez carreira no Diario de Pernambuco, onde foi de estagiária a editora do site, com passagem pelo caderno de cultura. Contribuiu para veículos como Correio Braziliense, O Globo e Revista Continente. Contato: carolsantos@marcozero.org