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Discurso de neutralidade pode beneficiar Raquel contra Marília pelo governo de Pernambuco?

Raíssa Ebrahim / 28/10/2022
Na imagem duas mulheres brancas, sentadas. A da esquerda é Marília Arraes, ela veste caça e camisa vermelha e um casaco mostarda, está com um leve sorriso. Ao fundo uma parede branca. Do lado direito da imagem está Raquel Lyra, ela usa calça e camisa azul claro, ela está sorrindo. Ao fundo uma parede cinza.

Créditos: Leo Caldas e Janaína Pepeu

Na reta final da disputa em segundo turno pelo Governo de Pernambuco, as candidatas Marília Arraes (SD) e Raquel Lyra (PSDB) têm investido em estratégias opostas. Enquanto a neta de Miguel Arraes nacionaliza o debate ao lado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a tucana, filha do ex-governador João Lyra Neto, tenta manter o plano local em evidência, evitando se posicionar sobre a eleição presidencial mais importante desde a redemocratização, apesar do palanque com muitos nomes ligados ao presidente Jair Bolsonaro (PL), como Coronel Meira, Mendonça Filho e Coronel Alberto Feitosa, e a presença dos fundamentalistas evangélicos, como os casais Tércio e Collins.

As duas campanhas têm feito movimentos de ataque vinculando a adversária a políticos bastante rejeitados e de gestões mal avaliadas em Pernambuco. Enquanto Marília joga o presidente Bolsonaro no colo de Raquel, Raquel joga o governador Paulo Câmara (PSB) no colo de Marília. A pesquisa Ipec divulgada na última terça-feira (25) aponta que Raquel está na frente, com 51% das intenção de votos, enquanto Marília tem 43%. Na pesquisa anterior, divulgada em 11 de outubro, elas tinham 50% e 42%, respectivamente.

O cientista político e pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj) Túlio Velho Barreto acredita que a aposta da candidata do Solidariedade em trazer a polarização Lula x Bolsonaro para o centro da disputa local pode favorecê-la e representar um fôlego extra na tentativa de virar o jogo, em especial após a vinda de Lula ao Recife há duas semanas. A Ipec publicada na terça (25) aponta que o ex-presidente do PT tem 69% das intenções no Estado, enquanto o presidente tem 26%.

Porém, em Pernambuco, apoiar Lula não significa necessariamente apoiar Marília. É uma eleição estadual que não está totalmente nacionalizada.

Como destaca a doutoranda em Ciências Política pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Marcelle Amaral, apesar de Lula ser favorito no estado, o pernambucano já provou, no primeiro turno, que rejeita o PSB, com o candidato Danilo Cabral tendo ficado em quarto lugar. “Marília agora significa, de certa forma, a continuidade do PSB. Ela se mostrava uma alternativa, mas, neste segundo turno, a rejeição ao PSB veio dos lulistas e dos bolsonaristas”, comenta.

Marcelle lembra que também a mudança de partidos não é vista como um fator de segurança por parte do eleitorado, mesmo desafetos políticos e familiares tendo se aliado em torno do nome de Marília, neste segundo turno, um cenário mais difícil com ela enfrentando Raquel do que teria sido se a disputa tivesse sido contra Anderson Ferreira (PL), por exemplo.

O cientista político Arthur Leandro coloca que, além de Marília se tornar destinatária de todos que, por alguma razão rejeitam o PT – e a rejeição ao PT é diferente da rejeição a Lula -, a candidata tem de lidar com a rejeição dentro do próprio campo progressista e da esquerda, seja no PSB ou no próprio PT. Na Rede, o deputado federal reeleito Túlio Gadelha oficializou voto na tucana na terça (25), abrindo uma crise na federação com o PSOL. “Raquel recebe os votos de Anderson em sua quase totalidade, a maioria absoluta dos votos de Miguel Coelho (União Brasil) e ainda parte dos votos de Danilo Cabral”, analisa.

Túlio lembra que “não havia uma candidatura favorita no início da campanha para primeiro turno, o que se refletiu na pulverização dos votos e de Raquel ser, entre as duas, aquela que traz uma experiência no Executivo, ainda que municipal”. Ele observa que “o favoritismo da ex-prefeita de Caruaru, como indicam as pesquisas, é fruto também, em alguma medida, do apelo emocional que a morte do marido, nas circunstâncias em que ocorreu, tem junto ao eleitorado”.

O peso dos palanques

Do ponto de vista da construção dos apoios, Túlio acredita que “desde o comício de Petrolina, quando Raquel Lyra apareceu com um adesivo de Bolsonaro na camisa, ficou mais difícil a candidata negar que, em Pernambuco, o seu palanque é o palanque do presidente da República”.

Por outro lado, Arthur acha que o esforço de jogar a pecha de candidata bolsonarista no colo de Raquel não tem funcionado muito bem, porque Raquel não é a a candidata de Bolsonaro no estado, o candidato oficial foi Anderson. Arthur comenta ainda que, adotando essa postura de neutralidade na polarização Lula x Bolsonaro, Raquel terminou se beneficiando. Assim, ela tem votos tanto entre os eleitores de Lula e quanto entre os de Bolsonaro.

“Essa expressão e imagem de não ter lado definido é capitalizada pela campanha de Raquel dizendo que ela é a candidata que vai trabalhar com qualquer presidente que ganhe, que ela vai ser a governadora de Pernambuco para todos os pernambucanos”, coloca Arthur.

Quem leva?

Arthur acredita que “Lula já carreou para Marília todos os votos que poderia e Marília já se apropriou desse capital político”. Túlio pensa diferente, entendendo que “a disputa continua relativamente em aberto em função de, nos últimos dias, a disputa nacional estar tendendo mais claramente para o ex-presidente Lula” e por conta das vinculações do palanque de Raquel, incluindo o impacto do episódio do adesivo.

“A decisão do segundo turno está nas mãos de quem não votou nem em Marília nem em Raquel Lyra no primeiro turno, na medida em que os votos dados aos candidatos que ficaram em terceiro, quarto e quinto lugares somaram mais que os votos dados às duas candidatas, que continuam na disputa”, acrescenta Túlio. Ele acredita que isso pode contribuir para uma certa “dança dos votos” na reta final, “porque não parece haver uma preferência, vamos dizer, ‘pura’ entre tais eleitores”.

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AUTOR
Foto Raíssa Ebrahim
Raíssa Ebrahim

Vencedora do Prêmio Cristina Tavares com a cobertura do vazamento do petróleo, é jornalista profissional há 12 anos, com foco nos temas de economia, direitos humanos e questões socioambientais. Formada pela UFPE, foi trainee no Estadão, repórter no Jornal do Commercio e editora do PorAqui (startup de jornalismo hiperlocal do Porto Digital). Também foi fellowship da Thomson Reuters Foundation e bolsista do Instituto ClimaInfo. Já colaborou com Agência Pública, Le Monde Diplomatique Brasil, Gênero e Número e Trovão Mídia (podcast). Vamos conversar? raissa.ebrahim@gmail.com